Como atuar para combater a evasão escolar
Crescimento do número de alunos fora da escola leva redes e escolas a planejarem estratégias de busca ativa
Dois anos de pandemia podem ter agravado dois problemas históricos da Educação brasileira: a evasão escolar, quando o aluno não se matricula no ano seguinte, e o abandono, quando o estudante, em algum momento do ano, deixa de frequentar as aulas, ainda que possa se matricular no ano seguinte. Antes da disseminação da covid-19, o país já registrava mais de 1,7 milhão de crianças e adolescentes fora da escola, segundo dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad Contínua), de 2018.
Com o fechamento das escolas, o ensino remoto emergencial não foi capaz de atingir plenamente os estudantes brasileiros, por motivos variados: falta de conexão com internet e de equipamento para acessá-la; dificuldade para receber atividades impressas; e alunos que tiveram de trabalhar para apoiar o sustento da família, entre outros.
Mesmo com a dificuldade de mapeamento dos dados pelas redes de ensino, os números de vários estudos indicam um sinal de alerta. De acordo com o levantamento C6 Bank/Datafolha, a taxa de abandono em 2020 foi de 10,8% no Ensino Médio e 4,6% no Ensino Fundamental. Estudantes de classes sociais mais baixas lideraram os índices de abandono. A taxa foi 54% maior entre os alunos das classes D e E (10,6%), na comparação com estudantes das classes A e B (6,9%).
Já o relatório da organização Todos Pela Educação estima que, no segundo trimestre de 2021, 244 mil crianças e adolescentes entre 6 e 14 anos ficaram fora da escola – um aumento de 171% em comparação a 2019, quando 90 mil crianças estavam afastadas. Em novembro, o estudo Permanência Escolar na Pandemia, feito pelo centro de pesquisas educacionais Interdisciplinaridade e Evidências no Debate Educacional (Iede) e pelo Comitê de Educação do Instituto Rui Barbosa (IRB), destacou que ao menos um a cada dez alunos do 9º ano estava em risco de evasão; já no 5º ano, a estimativa era de que 7,5% dos estudantes corriam risco de perder contato com a escola.
Mapeamento e reforço na busca ativa
“Fizemos uma pesquisa pelo Tribunal de Contas que mostrou que cerca de 50% dos alunos consumiam as atividades remotas utilizando um celular que tinham de dividir com seus irmãos e com os pais. Além disso, cerca de 20% não recebiam nenhuma atividade remota, apenas escritas. Então daí imagine como ficou frágil o vínculo dessas crianças com as escolas”, conta Paulo Curi, presidente do Tribunal de Contas de Rondônia (TCE-RO) e membro do Gabinete de Articulação para Enfrentamento da Pandemia na Educação de Rondônia (Gaepe-RO).
Desde o ano passado, os 52 municípios de Rondônia já aderiram à estratégia Busca Ativa Escolar, encabeçada pelo Unicef e feita em parceria com entidades nacionais, como a União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime). A iniciativa prevê a reunião de esforços de profissionais de diversas áreas (Educação, Saúde, Assistência Social etc.) para ajudar na realização de medidas para garantir a matrícula, a permanência e a aprendizagem dos estudantes. A conexão ocorre por meio de uma ferramenta tecnológica, disponível gratuitamente, que funciona como um grande banco de dados com informações dos alunos de determinado estado ou município.
Durante a pandemia também foi desenvolvido o guia Busca Ativa Escolar em Crises e Emergências para apoiar a tomada de decisão de gestores estaduais e municipais. “Comparativamente ao que vinha sendo realizado pelos municípios rondonienses, houve avanços, mas ainda estamos muito distantes do ideal em relação à implementação dessa estratégia. Neste ano, essas atividades vão persistir e eu espero que a gente consiga ter resultados mais expressivos em matéria de busca ativa e de reversão da evasão escolar”, avalia Paulo.
Na rede municipal de Mogi das Cruzes (SP), que também usa a plataforma do Unicef, o mapeamento realizado pelas direções das 213 escolas (110 municipais e 103 subvencionadas) no fim de 2021 mostrou que, do total de 47.054 alunos matriculados, 267 crianças não foram localizadas pelos agentes escolares. “Precisamos fazer um trabalho integrado com as equipes da Saúde e da Assistência Social municipais para localizar e redirecionar os alunos para a escola. Mesmo nos casos em que a família mudou de cidade, a ideia é acionar as equipes do outro município para garantir que esse estudante seja atendido por alguma rede de ensino”, explica André Stábile, secretário de Educação da cidade. A volta às aulas na rede acontecerá no dia 4 de fevereiro e a meta é ter um novo mapeamento da situação dessas crianças “invisíveis”, como diz, até março.
A busca ativa já aparecia como ação que recebia grande atenção dos gestores municipais em 2021, segundo pesquisa realizada pela Undime, em parceria com o Unicef e o Itaú Social, e que foi divulgada em dezembro. O empenho na localização de alunos evadidos foi apontado por 62% dos dirigentes como ação que recebeu grande foco das escolas no ano passado, ficando atrás apenas do suporte dado aos diretores (62,6%), e seguida pela atenção empenhada para criação de material pedagógico (60,8%) e o apoio para a realização de avaliações diagnósticas (59,7%). O levantamento ouviu 3.355 secretarias de Educação, que representam 60,2% do total de municípios do país e cerca de 13 milhões de estudantes.
No dia a dia das escolas, gestores e professores podem desenvolver estratégias variadas, como promover a escuta de alunos e famílias a respeito dos motivos do abandono, envolver os próprios estudantes nas conversas com os colegas que estão fora da escola, realizar parcerias com a comunidade local etc. Aqui, uma caixa com orientações para o combate à evasão de meninas.
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