Para colocar em prática

Como apoiar e ler os desenhos das crianças

Pontos para observar e compreender melhor a turma a partir das produções

Ilustração de professora com livros, folhas de papel e objetos de desenho dispostos ao redor.
Ilustração: Juliana Blanc/NOVA ESCOLA

É comum se deparar com o desenho de uma criança e questioná-la sobre seu significado, principalmente quando se trata de uma garatuja - como são chamados os rabiscos da fase inicial das crianças de até aproximadamente 2 anos. 

No entanto, nem sempre é possível atribuir um título às criações dessa etapa. “Nem sempre um grafismo representa algo. Claro, é um desenho expressivo, mas não necessariamente representativo de algo”, explica Silvana de Oliveira Augusto, autora do livro Ver Depois de Olhar: A formação do olhar dos professores para os desenhos de crianças.

Mais do que buscar significados, é preciso olhar para o que os registros comunicam sobre a criança. Sem julgar ou classificar. E, tão importante quanto, compreender que são mais do que simples rabiscos. “Os rabiscos não são 'só' nem 'pouco'. Eles trazem a marca expressiva da criança”, completa a pesquisadora.

Nesse sentido, Rosa Iavelberg, docente da Faculdade de Educação da USP e autora do livro O Desenho Cultivado da Criança: Práticas e formação de educadores, ressalta que o desenho é uma ferramenta de expressão de sentimentos, experiências e pensamentos das crianças. E o educador tem papel-chave nisso. Afinal, o que os pequenos conhecem do mundo e a forma como interagem com o outro influencia essas criações.

“O modo como o professor olha os desenhos tem muito significado para as crianças. Elas buscam uma resposta e uma interação com o que estão fazendo. Porém, não devemos perguntar o tempo todo o que desenharam, porque o desenho em si já é expressivo e ela espera que ele seja suficiente. Quando uma criança quer dizer sobre o seu desenho, ela mesma tem essa iniciativa”, completa Silvana Augusto.

Antes de buscar interpretações, é preciso ler esses desenhos para compreender o que comunicam. Assim, o educador consegue propor boas intervenções que contribuem para o desenvolvimento e aprendizado das crianças.

Pontos para observar

Na fase das garatujas, é importante observar a forma como as crianças se apropriam dos materiais. Vale atentar-se a questões como: o que a criança está usando para riscar? O material obedece ao movimento que ela quer imprimir? É preciso fazer muita força? O suporte e a forma como a criança constrói o espaço também é um ponto de observação. Ela precisa de mais espaço para desenhar? Precisa de um papel maior?

Dessa forma, é possível selecionar materiais mais adequados para a criança trabalhar. Ao variar os materiais e superfícies, as crianças passam a ter uma diversidade de experiências com o desenho, explica Rosa Iavelberg, o que contribui para seu desenvolvimento, expressão e criatividade.

Quando os pequenos passam a fazer desenhos mais organizados, é interessante conversar sobre eles e investigar as narrativas que surgem a partir das criações. “Nesse momento, é importante fazer rodas para as crianças observarem os desenhos umas das outras. Assim, elas observam as diferentes soluções para um mesmo tipo de papel e se inspiram para novas produções”, sugere Silvana.

Tudo isso contribui para o educador ler os desenhos infantis. “Esse é o primeiro passo antes de interpretar, porque quem precisa interpretar os desenhos são as próprias crianças. Quando elas apresentam os desenhos, são elas que dizem o que produziram e as ideias que têm ali. É preciso menos interpretação e mais leitura, mais uso dos elementos que compõem a linguagem do desenho para ampliar o repertório das crianças”, reflete.

Conhecendo a turma a partir dos desenhos

Em sua experiência na rede municipal de Educação de Curitiba, Ademari Depetris, professora-autora de Educação Infantil de NOVA ESCOLA, utiliza os desenhos para observar as particularidades dos alunos e conhecer melhor a turma. Uma forma de fazer isso é propor um desenho a partir da imaginação das crianças. A professora seleciona um tema e os pequenos devem fazer suas criações livremente.

“Quando as crianças fazem um desenho livre, elas contam uma história sobre o que fizeram. Geralmente, há uma ação representada ali, e isso trabalha também a oralidade das crianças na medida em que compartilham o que imaginaram e como representaram isso por meio do desenho”, conta.

Por serem uma forma de expressão, os desenhos são uma ótima ponte para os educadores se aproximarem dos interesses da turma. “Sente-se com eles para observar e conversar sobre os desenhos que produziram. Nessa atividade complementar surgirão novos assuntos, perguntas e até a necessidade de referências”, pontua Silvana.

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