Como duas gestoras organizaram o conselho de classe de 2021 em suas escolas
Avaliação com base em situações reais e concretas, valorização do caráter formativo do encontro e flexibilidade para não reprovar: saiba como diretoras de instituições na periferia de São Paulo e em Goiânia têm colhido com a equipe os dados e ensinamentos sobre mais este ano atípico
Depois de dois anos tão atípicos para a Educação, professores e gestores têm agora a necessidade de avaliar os alunos antes de iniciar 2022, que deve ocorrer de forma 100% presencial. Mais do que uma formalidade burocrática, a avaliação do desempenho, da frequência, da participação e de outros dados é essencial para a compreensão do que aconteceu nos últimos meses e para o planejamento das próximas ações da escola.
Paula Mangolin de Barros é doutoranda em Educação e diretora da Escola Municipal de Ensino Fundamental (EMEF) M'Boi Mirim 1, localizada no Jardim São Luís, bairro da periferia da capital paulista. Paula conta que, neste momento de finalização do ano letivo, é impossível não considerar as dificuldades vivenciadas pela comunidade escolar durante a pandemia. “Nossas crianças passaram fome. Nossa maior preocupação era garantir que elas tivessem comida. Agora, precisamos voltar para a função da escola, que é promover aprendizagens. O conselho de classe é este momento de olhar e traçar possibilidades de recuperação”, comenta.
Apesar das muitas dificuldades, a EMEF M'Boi Mirim 1 não sofreu com a evasão de alunos, reclamação que Paula diz ouvir de muitos colegas gestores. Com cerca de 90% dos alunos de volta às aulas presenciais, novas perspectivas foram criadas sobre o modo de avaliar. “Temos de considerar toda essa readaptação ao cotidiano escolar. Agora, mais do que nunca, não se pode avaliar o aluno apenas pelo que ele produz. Precisamos olhar para os contextos histórico, familiar e econômico dessas crianças e adolescentes. Se não fizermos isso, seremos muito injustos.”
Avaliação com base em situações reais e concretas
No momento do conselho, é preciso que a equipe pedagógica já tenha claro quais alunos tinham condições de acompanhar as atividades on-line, quais receberam apenas atividades impressas, quais deram pouco ou nenhum retorno e também qual era o apoio familiar recebido por cada aluno. Mais do que notas e frequência, é preciso considerar o que o estudante conseguiu desenvolver com as condições disponíveis e qual foi seu desenvolvimento em relação a si mesmo ao longo do tempo. O foco deve estar nas situações reais e concretas, não em um ideal de ensino-aprendizagem que nem os professores nem os alunos conseguiram alcançar ao longo da pandemia.
O conselho de classe entre a avaliação e a formação
Eliane Cristina Luiz Sobrinho, diretora do Colégio Estadual Aécio Oliveira de Andrade, em Goiânia (GO), destaca também a importância de que os docentes reflitam sobre a própria prática pedagógica durante o conselho de classe. "Às vezes, um professor tem uma percepção do estudante que outro professor não tem. Portanto, trazer essa percepção para o coletivo permite termos uma visão muito mais global do processo de aprendizagem do que aquele aluno vivenciou”, comenta a diretora, que diz considerar o conselho um momento não só avaliativo, mas também, formativo para a equipe, um momento para considerar algumas falhas em suas práticas e buscar enriquecê-las.
O conselho de classe das 16 turmas (Ensinos Fundamental e Médio) da escola ocorre em um único dia, dedicado exclusivamente para isso, mas antes é realizado um pré-conselho. A secretaria da escola imprime um quadro com indicadores e gráficos – como aulas previstas, aulas dadas, notas e frequência – e em um momento de horas-atividades dos professores os coordenadores pedagógicos se reúnem com eles para conversar sobre o que foi feito nos últimos meses e quais dificuldades foram encontradas. Assim, quando o encontro é realizado, as discussões sobre o desenvolvimento da turma, disciplina, interação, comunicação e pontos de atenção acontecem de modo mais fluido.
Aprovação e reprovação dos estudantes
Segundo a diretora Eliane, uma questão que tem preocupado muito a equipe pedagógica é a aprovação ou reprovação dos alunos. Nos últimos meses, os docentes têm estabelecido novos critérios do que será considerado o mínimo esperado para aprovação e estratégias de recuperação para o próximo ano. “A reprovação não é a saída. Não estamos aqui pra avaliar nesse sentido, queremos avaliar o que a escola ensinou. Se durante a pandemia a escola não conseguiu alcançar a todos, como deveria, o aluno não pode pagar por isso”, reflete Eliane.
Paula Mangolin conta que também ouve muito dos pais dos alunos “você vai reprovar meu filho, né?” Com essa pergunta, alguns responsáveis expressam querer que os filhos sejam retidos por não considerarem que aprenderam o necessário, enquanto outros não desejam que isso aconteça. “Eu respondo que a nossa intenção não é reprovar. A gente tem de entender que a reprovação individual não resolve nada. Temos tentado construir com as famílias no conselho da escola o entendimento de que é possível estabelecer estratégias e mecanismos para recuperarmos a aprendizagem. A reprovação não necessariamente dá conta disso”, explica a diretora.
As duas gestoras contam que já estão pensando em estratégias de recuperação e reforço escolar para o ano de 2022, mas que os resultados e encaminhamentos do conselho de classe realizado ao final do último bimestre de 2021 ajudam a entender ainda mais quais são as necessidades dos estudantes. Considerando todas as defasagens que a Educação sofreu durante a pandemia, o desafio será pensar em ações que incluam toda a escola, não apenas alunos específicos.
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