Para usar com os alunos

Leitura compartilhada para o autoconhecimento e a empatia

Ler é, por excelência, uma atividade individual. Como torná-la uma oportunidade de construção de conhecimento sobre si mesmo e sobre o outro?

Ilustração de 3 crianças lendo cada uma um livro, enquanto elementos gráficos mostram o compartilhamento na leitura.
Ilustração: Rafaela Pascotto/NOVA ESCOLA

A partir de uma troca sincera de olhares sobre o que foi lido, e como a leitura dialoga com suas próprias experiências, cria-se um terreno fértil para o trabalho das habilidades gerais da Base Nacional Comum curricular (BNCC) que tratam de autoconhecimento, empatia e cooperação. 

Que tal colocar as rodas de leitura inspiradas no modelo de tertúlias literárias? 

Trata-se de um processo consagrado de leitura dialógica que inclui três movimentos: a leitura de um trecho determinado da obra trabalhada com a discussão com pessoas do convívio do leitor; a escolha de um parágrafo que tenha tocado o leitor; e a leitura deste trecho na tertúlia, com a justificativa da escolha. O diálogo é sempre horizontal e igualitário, ou seja, de forma ordenada e mediada. A escolha de títulos universais também define o que são tertúlias literárias. 

“Os argumentos apresentados nunca são contra a outra pessoa, o mediador tem sempre de explicitar que as ideias são diferentes, mas válidas. É fundamental que o mediador não normatize opiniões ou permita o julgamento da cultura alheia, elas são momentos de diálogo mediado em que os alunos podem expressar as próprias impressões enquanto ouvem e absorvem o mesmo dos colegas”, explica Roseli Rodrigues de Mello, professora da Universidade Federal de São Carlos (UFScar) que pesquisa o assunto há duas décadas, além de ser uma das responsáveis por introduzir o conceito de tertúlia literária na Educação brasileira.

“Gosto da ideia de buscar inspiração no desenho das tertúlias literárias porque o livro que será lido é decidido coletivamente,  tal como qual trecho será lido antes do encontro, e cada leitor é convidado a selecionar um trecho que ele acha significativo para expor. O professor apenas gerencia a palavra, sem emitir opinião”, diz Mazé Nóbrega, assessora pedagógica e consultora em metodologia de Língua Portuguesa de NOVA ESCOLA.

As tertúlias nasceram na Espanha, na virada dos anos 1970 para os 80, como forma de levar a leitura de obras mestras para a educação de adultos, especialmente da classe trabalhadora. A palavra tertúlia existe em português e significa "encontro de amigos para conversar ou ler". Mas é um termo pouco usado no Brasil, diferentemente do que ocorre em Portugal e na Espanha. Por lá, ela define um encontro. 

Rafael Sachs, professor de Língua Portuguesa do Colégio Santa Cruz, na capital paulista, adota as rodas de leitura inspiradas nas tertúlias com as turmas de 8º ano. “O trabalho envolve uma relação entre o texto literário lido e experiências pessoais, reflexões pessoais, impressões, memórias... Tudo isso contribui para explorarmos a questão do autoconhecimento e da empatia”, afirma Rafael. Além disso, explica, é necessária uma boa orientação dos alunos sobre o formato da roda de leitura da qual vão participar. Eles precisam saber que é uma atividade de diálogo, de troca de experiências. 

Nova Escola Box conversou com Rafael Sachs sobre como encaminhar a proposta. Confira a sugestão de atividade elaborada por ele.

divisória de atividade

ATIVIDADE: Roda de leitura inspirada em tertúlias literárias

Convide a garotada para ler uma obra e dialogar sobre ela de modo horizontal


Indicado para: Turmas do 6º ao 9º ano

Na BNCC: Competências gerais 8 e 9 e Habilidades específicas de Língua Portuguesa EF69LP46 e EF69LP49.


PASSO A PASSO

1. Escolha o título: A tertúlia parte de um texto literário. Então, o primeiro passo é eleger o texto literário que você considera propício para fazer a roda de leitura, levando em conta as competências Autoconhecimento e Autocuidado e Empatia e Cooperação e as preferências, os interesses e as sugestões dos estudantes (confira algumas sugestões aqui)

2. Apresente as tertúlias: Explique para os alunos que vocês vão trabalhar com rodas de leitura inspiradas no modelo da tertúlia literária, uma atividade de diálogo, e que eles estarão num ambiente de troca de experiências. Explique que a tertúlia envolve a leitura prévia do trecho combinado e que cada participante deve selecionar um trecho que o tenha tocado ou tenha algum significado especial. Com base na escolha, o aluno escreve seu comentário, que será lido para os demais colegas. 

Ponto de atenção: Oriente os alunos para que essa escolha não seja pautada por questões intelectuais, gramaticais ou técnicas do estudo da literatura. Trata-se de uma escolha pessoal. Então, na justificativa eles devem dizer o porquê da escolha e como ela dialoga com eles mesmos. 

3. Organize a dinâmica: Combine com a turma se o texto vai ser lido por inteiro ou em partes. Isso define também o número de tertúlias que serão necessárias. Para textos curtos, como contos e poemas, uma sessão é suficiente. Mas se for trabalhar um livro maior, planeje quatro ou cinco sessões, sempre determinando qual o trecho deve ser lido previamente. 

4. É hora da roda! Organize os alunos sentados em círculo ou reúna todos em um encontro virtual e oriente para que deixem a câmera ligada, para que o contato olho no olho aconteça. Coloque-se como um dos participantes, também na roda. 

Ponto de atenção: A recomendação é de que o professor fique neutro, apenas coordenando as falas, enquanto os alunos atuam como protagonistas, levantando discussões. 

5. Defina a dinâmica: Por meio de inscrições, estabeleça a ordem dos momentos de fala – tanto para a leitura do trecho selecionado quanto para comentar o trecho escolhido por um colega. A cada leitura, pergunte se mais alguém tem algo a complementar. Se necessário, limite o número de comentários por conta da questão do tempo. Exemplo: para cada leitura, dois ou três comentadores. Depois, abra espaço para um novo trecho. 

Ponto de atenção: Os alunos podem manifestar dificuldades como a distância com relação aos hábitos de leitura e a timidez. Diante disso, além da proposta de leitura, ofereça algumas questões temáticas que a leitura da obra possa suscitar. A ideia não é direcionar, apenas levantar possibilidades. Exemplo: quais temas contemporâneos podem ser percebidos nessa obra literária? Também para superar possíveis dificuldades de interpretação, mantenha-se aberto a perguntas, embora isso também não seja parte da tertúlia tradicional. Quando o aluno traz dúvidas específicas de compreensão, os colegas também podem colaborar.

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