Os esforços e desafios de 3 educadoras para promover uma transição saudável na pandemia
Estratégias passam pelo acompanhamento via WhatsApp, foco no Projeto de Vida e trocas entre os próprios estudantes
A passagem do Ensino Fundamental para o Médio é um período importante de inquietação na trajetória escolar, fase que ganhou contornos especiais diante dos desafios impostos pelas aulas remotas. A distância física, porém, não impede que escola e professores continuem apoiando os estudantes nesta hora: com o suporte das ferramentas digitais, e uma grande dose de dedicação, eles mantêm a agenda de ações para uma transição saudável para meninos e meninas que chegarão ao Ensino Médio em 2021.
Conheça, a seguir, algumas dessas histórias:
“Os alunos sentem segurança quando já nos conhecem”
Afrânia Lomar é professora em duas escolas do mesmo bairro, o Feu Rosa, em Serra (ES). Faz parte de sua rotina anual encontrar em suas aulas de Biologia do 1º ano do Ensino Médio da EEM Marinete Lira seus alunos de Ciências do ano anterior, o 9º ano da EEM Antônio Engrácio. “Eles sentem segurança quando já nos conhecem. Então, quando têm qualquer dificuldade em relação à escola eles nos procuram”, explica.
Conhecer o aluno que está chegando ao Ensino Médio é importante mesmo quando não se trata de um de seus ex-alunos. Para isso, há uma troca constante de informações sobre os alunos entre os professores, mesmo em tempos de isolamento social. “Então eu conheço meu aluno do Ensino Médio mesmo que eu não tenha dado aula para ele. Quando eles chegam na escola nova a gente já sabe: esse aluno não tem a alfabetização consolidada, esse aluno tem alguma outra dificuldade, ele é atendido na educação especial. Então a gente consegue trabalhar de uma forma mais harmônica e acolhedora”, destaca a professora.
Acolher os alunos durante o ensino remoto excede as questões curriculares. Para manter a motivação e consolidar um canal confiável de comunicação entre estudantes e escola, Afrânia conta que nas duas escolas em que trabalha foram criados grupos de WhatsApp, cada um dos grupos conta com um “professor de referência”, um profissional que pode ser acionado pelos alunos daquele grupo para qualquer tipo de inquietação. Afrânia é professora de referência de duas turmas de 9º ano. O WhatsApp é a ferramenta para incentivá-los a comparecerem nas aulas remotas e lembrá-los da entrega de atividades, por exemplo. “É um trabalho de pegar no pé. Muitos fingem que não viram a mensagem e eu vou lá e falo que vi que ele visualizou. É toda uma tentativa de convencimento”, conta. “A gente precisa ter muita sensibilidade, não pode ter o mesmo rigor. Temos de trabalhar, estar abertos ao diálogo. Eles mandam mensagem direto quando precisam de alguma coisa, tenho a preocupação de responder a todos. A gente tenta amenizar da melhor forma possível”, resume a professora.
“São desafios diários de adaptação”
“Os alunos do Ensino Fundamental são, geralmente, ainda dependentes dos professores, questionam tudo, precisam do aval e de orientações. Por isso é fundamental desenvolver a autonomia”, conta Giana Martins, diretora da EE Mater Dolorum, escola que atende o Fundamental 2 e, no Ensino Médio, as modalidades Integral (EMITI), Novo Ensino Médio (NEM) e o Ensino Médio Noturno em Capinzal (SC).
Para isso, um dos pilares é o trabalho com Projeto de Vida. Outra ação é apresentar os alunos do Fundamental à rotina do Ensino Médio, convidando os estudantes das duas etapas a passarem um tempo juntos, em atividades específicas, para que eles sintam “o acolhimento e o gostinho de estarem em outra rotina”. De setembro a novembro há um cronograma de visitas também de turmas de 9º ano de outras escolas. “Também reunimos as famílias juntamente com seus filhos antes do fim do ano letivo para apresentar a dinâmica de trabalho do Ensino Médio e o diferencial de oferta da escola”, explica a diretora.
O estado de Santa Catarina planeja retomar as aulas presenciais na segunda quinzena de outubro e Giana trabalha com essa perspectiva para manter as atividades presenciais entre os alunos do 9º e do 1º ano. Caso o retorno não aconteça, a diretora e sua equipe já trabalham para que as atividades de introdução aconteçam, mesmo que de forma remota. “São desafios diários de adaptação. Estivemos por algum tempo nos estruturando, estruturando nossos alunos, por conta das dificuldades de acesso e conexão. Agora, já iniciamos os componentes do Projeto de Vida, com atividades e ações mais sequenciais, mesmo a distância.”
“É uma troca muito bonita”
A Escola Vera Cruz é uma instituição privada da cidade de São Paulo, com agenda intensa de atividades para que os alunos façam uma transição suave para o Ensino Médio.
Umas das experiências mais proveitosas, segundo Ana Bergamim, coordenadora do Ensino Médio da escola, são as atividades em que os alunos do 1º ano recebem os do 9º. “É uma troca muito bonita. Enquanto os mais velhos relembram como se sentiam naquele momento, os mais novos se abrem mais ao verem que os mais velhos realmente entendem suas inquietações”, afirma. Embora o diálogo e as atividades que envolvem os professores sejam fundamentais, essa troca entre os próprios estudantes são as que apresentam melhores resultados.
Com o distanciamento físico, eventos como festivais de música e oficinas, em que os alunos do Ensino Médio recebem os do 9º ano, não acontecerão neste ano. Já as rodas de conversa migraram para o mundo digital: “Estamos fazendo on-line as reuniões com as famílias e as rodas de conversa entre os alunos também acontecerão”. O formato ainda não está totalmente definido, mas, para melhorar a comunicação, o mais provável é que se reduza o número de alunos em cada reunião. “Normalmente, uma sala do 1º ano recebe uma do 9º, porém agora estamos revendo”, conta Ana, que se preocupa com a qualidade da comunicação entre os adolescentes nas plataformas digitais.
Outro ponto importante da transição no Vera Cruz é feito entre a equipe docente: no começo de cada ano letivo os professores do 1º ano recebem as turmas dos seus colegas do 9º. Essa passagem é feita por turma, e não por disciplina ou área de conhecimento. “Cada turma tem especificidades no aprender e questões pertinentes àquele grupo. Por isso fazemos a passagem por turma. O objetivo é mostrar as características daqueles alunos e não o que cada um aprendeu ou não, tendo como base apenas o cumprimento da grade curricular”, reflete Ana.
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