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Como cuidar da sua formação em casa e na pandemia

É consenso que a formação docente não pode parar. Mas como dar conta de tudo, quando a pandemia impõe uma rotina ainda mais corrida?

Ilustração criada a partir de colagem digital de professora regando flores que saem de sua cabeça.
Ilustração: Rafaela Pascotto/NOVA ESCOLA

O WhatsApp não para. O tempo na tela ultrapassa o saudável. Tem as aulas dos alunos, tem as aulas dos filhos. Tem o atendimento às famílias dos estudantes, tem as tarefas domésticas, a alimentação, o cuidado com a casa, os cuidados com a saúde, redobrados em tempos de pandemia. 

Após um ano, é verdade que os professores se adaptaram às ferramentas tecnológicas e lidam com mais tranquilidade com o trabalho remoto. Mas é verdade também que essa nova rotina esgota. Como encontrar tempo e disposição para estudar?

A resposta varia, como são diversas as realidades de cada professor deste país. Para Walkíria Rigolon – doutora em Educação, professora dos anos iniciais e do ensino superior, além de pesquisadora no campo da formação continuada –, o período de pandemia intensificou sobremaneira as atividades docentes, pois conciliar o trabalho na esfera de vida privada não é tarefa fácil. 

Por isso, o  movimento de aprendizagem e aprimoramento contínuo precisa ser estimulado nas escolas – lócus privilegiado de formação continuada –, fortalecendo os momentos coletivos para que as ações desenvolvidas possam inspirar os momentos de estudo individual.

“Diante disso, um levantamento coletivo realizado na escola, acerca das necessidades formativas da equipe, pode contribuir, por exemplo, para que sejam levantadas temáticas a serem aprofundadas coletiva e individualmente”, explica a pesquisadora. 

A partir dessa identificação, professores e equipe gestora podem produzir um acervo de consulta para estudo e formação com referenciais teóricos, projetos, relatos de experiência, compartilhamento de atividades, artigos e pesquisas, entre outros materiais que, selecionados previamente, podem contribuir com a formação continuada.

Rotina e organização pessoal 

No entanto, mesmo com o apoio da escola, é necessária uma firme organização pessoal. Quando é possível construir uma rotina diária, mantendo uma agenda com os compromissos e distribuindo as atividades no dia, é mais fácil encontrar um momento para estudar, considerando-o como mais um momento de dedicação, avalia a supervisora pedagógica da consultoria educacional do Instituto Singularidades, Sofia Alencastro. “Nesse sentido, evitar o acúmulo de  informação, buscando aquelas que de fato são necessárias, é fundamental. E não se esquecer de deixar momentos para dar uma parada e fazer uma atividade totalmente diferente daquelas do cotidiano”, orienta a psicóloga. 

Para dar o primeiro passo e retomar os estudos, Sofia sugere resgatar conteúdos que já foram vistos, não só para visitá-los, mas para aprofundá-los, ampliando conhecimentos que podem de fato fazer a diferença. “É melhor do que acumular grande quantidade de informações não conectadas ou conhecidas de forma superficial”, avalia a psicóloga. “É uma ilusão acreditar que saber um pouco de muita coisa nos ajuda a viver melhor. Não devemos priorizar a quantidade, mas a qualidade dessa informação para nossa vida”, conclui.

Para Walkíria, uma boa maneira para seguir se aprimorando num momento adverso é participar de grupos de estudo e formação. “Neste sentido, a participação em fóruns, grupos de pesquisa, lives e podcasts que tratem das temáticas nas quais precisamos ou desejamos nos aprofundar podem contribuir para nosso processo de reflexividade crítica”, explica a pesquisadora. Se é fato que muitos cursos surgiram neste período de pandemia, é importante avaliar aqueles que realmente valem a pena, com temáticas que se conectem de fato com o que precisamos ou desejamos estudar. “Assim, a chance de nos mantermos engajados durante os encontros são mais altas”, afirma Walkíria, que sugere, ainda, que os professores se organizem entre si em grupos de estudo com temas de interesse comum, com encontros sistemáticos para discussão e diálogo acerca do que foi estudado. “As atividades coletivas nos animam mais, embora também exijam momentos de estudo e leitura individual”, conclui.

5 dicas para organizar os estudos em casa

- Estude em grupo: a troca é fundamental e nos sustenta emocionalmente.

- Escolha situações de estudo teórico-práticas, como baseadas na resolução de estudo de caso ou discussões de situação-problema.

- Distribua o que precisa ser estudado em partes sequenciais e coordenadas.

- Reflita sobre os objetivos do estudo em relação às reais necessidades pessoais.

- Trace metas de realização, discriminando aquelas de curto, médio e longo prazo.

O que dizem as professoras que apostaram na formação na pandemia 

Para ajudar docentes do Ensino Fundamental a colocar ordem na casa – essa mesmo, que agora também é trabalho –, NOVA ESCOLA ouviu quatro professoras que encararam o desafio de continuar estudando mesmo com suas agendas lotadas. Elas contam suas experiências individuais, falam da necessidade de ampliar a formação, e indicam os cursos que fizeram, muitos deles em plataformas gratuitas.  


“Com a pandemia, a atualização tornou-se obrigatória.”
Vilma Soares, diretora da EM Profª. Maria Anger Dias Guarino, em Duque de Caxias (RJ), fez mestrado em Educação em 2020. 

O professor sempre teve de se atualizar em "dias normais" – e com a pandemia essa atualização tornou-se obrigatória. Todos os professores tiveram de se reinventar para se adequar à nova realidade. Eu já estava cursando Mestrado em Educação antes da pandemia e, com ela, o curso também passou por modificações em relação às aulas. 

Escolhi cursar mestrado para expandir meus conhecimentos e me tornar pesquisadora. Foi muito difícil no começo conciliar o trabalho remoto, a vida de estudante e os afazeres domésticos, mas, com o decorrer do isolamento essa nova rotina passou a fazer parte do cotidiano. Como era algo novo e inesperado, as tarefas misturavam-se no dia a dia, mas a organização do tempo é o que tem me ajudado.


“O primeiro passo é definir o seu objetivo.”
Danúbia Teixeira é professora de Português e Inglês dos ensinos Fundamental e Médio na EE Alberto Caldeira, de Guanhães (MG), e professora de Língua Portuguesa na Faculdade Única de Ipatinga (MG), na modalidade EaD para os cursos de licenciatura.

É impossível ser professor sem se manter atualizado, ainda mais neste cenário incerto. Nunca conheci uma mulher que fosse apenas professora, todas somos sempre mães, esposas, filhas, irmãs, amigas, pesquisadoras, enfim... Somos multitarefas. 

É difícil conseguir desempenhar tantas funções com êxito. Eu me valho do planejamento: preciso de dias ou momentos de folga, e me organizo para realizar tarefas domésticas, cuidar dos meus filhos, realizar minhas pesquisas e trabalhar. 

Outra coisa que ajuda é alternar as funções. Por exemplo: nos dias mais estressantes eu coloco algo que me dá prazer. É importante ter tempo para si, para se refazer. É importante ainda não perder de vista nosso crescimento profissional, reservar tempo para fazer cursos e participar de eventos. Meu planejamento inclui basicamente trabalho, estudos e lazer. 

O maior desafio deste contexto de ensino híbrido ou a distância foi ter de reaprender a ensinar. Aprendemos a agir e a nos planejar visando unicamente à sala de aula. A pandemia nos obrigou a reaprender a ensinar, a pensar fora da caixinha, a buscar soluções e alternativas. A metodologia até então utilizada, de um dia para o outro, tornou-se obsoleta. E mudar dói. 

Testar, aprender, repensar, são ações que causam incômodo porque nos tiram de nossa zona de conforto. E, como professores, sempre esperam que saibamos as coisas. Dessa vez, assim como os alunos e juntamente com eles, nos coube aprender.

Assim, estudar sobre o ensino híbrido e sobre o ensino a distância é estudar sobre humildade para reaprender, e sobre empatia para buscar a melhor solução para cada aluno. Sabemos que os contextos educacionais são múltiplos e adversos e, novamente, cabe ao professor a missão de se adequar para continuar ensinando, apesar do contexto.

O primeiro passo é definir o objetivo: seu objetivo é fazer cursos de atualização? A Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) possui uma plataforma chamada Lumiona, com mais de 50 cursos em diversas áreas, todos na modalidade EaD, gratuitos e com certificado. Na página da Olimpíada de Lingua Portuguesa – Escrevendo o Futuro, também há vários cursos gratuitos e com certificados. Se o objetivo é entrar num programa de mestrado ou doutorado, o ideal é tentar entrar como aluno especial, cursando uma disciplina isolada. Também é preciso se preparar para a prova de proficiência estudando uma língua estrangeira, escrever o projeto de pesquisa e buscar quais são as instituições que ofertam o curso que você busca. Ler é sempre uma atividade imprescindível. Há uma infinidade de grupos no Telegram para trocas de livros em PDF e de dicas de leitura.


“O mundo mudou, precisamos entender isso.”
Professora de História do Fundamental 2 na EE Euclides da Cunha e do Ensino Médio na EE Ana Libória, ambas em Boa Vista (RR), Herika do Valle fez cursos para dar aulas on-line. 

Estamos numa sociedade líquida, como diz o sociólogo Zygmunt Baumann. Tudo tem sido efêmero, inclusive as formações e informações que antes eram dadas como certas, inalteradas ou incontestáveis. O mundo mudou, precisamos entender isso. A carga horária no trabalho em home office aumentou neste período de aulas remotas, uma vez que o atendimento ao aluno tem sido individualizado. Entretanto, a necessidade de reservar duas horas semanais para formação continuada (atualização), mais do que nunca, é necessária. 

Neste período de pandemia fiz cursos de Planejamento inverso em aulas remotas, Ensino de História: teoria e prática, Uso de Padlet, Jamboard, gravação e edição de vídeos. Tudo pela internet e de graça. Recomendo todos os cursos do Educaethos, Amplica Fix, Google for Education e os cursos de extensão que as Universidades e Institutos têm oferecido. O livro Ensino Híbrido, da Lilian Bacich, é de uso obrigatório para todos os professores que querem sair do feijão com arroz.


“O curso tem de fazer sentido para a sua trajetória.”
Raquel Said, professora de Língua Portuguesa do Fundamental 2 e Médio no Colégio Piaget, de São Bernardo do Campo (SP), conciliou a maternidade com pós-graduação on-line em metodologias de ensino durante a pandemia. 

Temos hoje uma geração que tem acesso a todos os tipos de informação, entretenimento e cursos através de um computador. Ou seja, temos estudantes que possuem boa bagagem cultural e acadêmica. Como professores, somos "obrigados" a sempre fazer cursos, ver palestras etc.

Precisamos estar alinhados com os estudantes e, neste um ano de pandemia, isso foi ainda mais fundamental, pois passamos a dar aulas on-line e a usar ferramentas digitais que até então pouco conhecíamos, mas que a maioria dos alunos já dominava.

Durante a pandemia fiz pós-graduação em Novas Metodologias do ensino da Língua Portuguesa. Iniciei no presencial, mas, por causa da pandemia, passamos para o on-line. Fiz essa pós porque aprender novas metodologias de ensinar é sempre válido e necessário. Um professor não pode parar de estudar.

É  complicado conciliar todas as atividades, até porque tenho duas crianças. Dou muitas aulas por semana e isso gera uma demanda enorme de correções, revisões, leituras e preparo de provas, atividades, reuniões etc.

Para que tudo funcione, separei três dias da semana para cuidar dos afazeres do colégio em que dou aula e dois dias para me dedicar à pós. Dessa forma ficou um pouco organizado, mas nem sempre consigo manter esse esquema: tenho um bebê de 1 ano e 4 meses e uma criança de 8 anos, que vez ou outra precisa de ajuda nas lições de casa.

Para escolher o melhor curso, o ideal é pesquisar bastante, ler toda a carga horária para não ter surpresas no meio do caminho e não se sentir desestimulado. É bacana saber onde se quer chegar para então ter uma meta e se dedicar a alcançá-la. Fazer qualquer curso por fazer não é válido. Ao escolher um curso, ele tem de fazer sentido em sua trajetória.


Para saber mais:

Cursos e plataformas de formação docente indicados pelo Instituto Singularidades:

Autobiografia: Intervenção docente e a formação do aluno no século XXI
https://loja.isesp.edu.br/produto/autobiografia-intervencao-docente-e-a-formacao-do-aluno-do-seculo-xxi/

Neurociências: Do cérebro infantil ao adolescente
https://loja.isesp.edu.br/produto/neurociencias-do-cerebro-infantil-ao-adolescente%e2%80%af/

Jogos e Cultura Digital na Educação
https://loja.isesp.edu.br/produto/cultura-digital-e-jogos-na-educacao/

Narrativas em Vídeo na Educação
https://loja.isesp.edu.br/produto/narrativas-em-video-na-educacao/

Narrativas Gráficas para Educadores
https://loja.isesp.edu.br/produto/narrativas-graficas-para-educadores/

Podcast e Educação: A produção de mídia na escola
https://loja.isesp.edu.br/produto/podcast-e-educacao-a-producao-de-midia-na-escola/

Metodologias ativas de Aprendizagem: Princípios, prática e tecnologias
https://loja.isesp.edu.br/produto/metodologias-ativas-de-aprendizagem/

Cursos do Escolas Conectadas
https://comunidade.escolasconectadas.org.br/login/index.php

Formações do Itaú Social
https://polo.org.br/formacoes/cursos

Cursos da Fundação TelefônicaVivo
https://fundacaotelefonicavivo.org.br/inovaescola/curso-ead/

Portal Trilhas (Natura)
https://portaltrilhas.org.br/inicio?redirect=%2Fead

Comunidade de Aprendizagem e Ansino a distância (Natura)
https://www.comunidadedeaprendizagem.com/ead/

Escola Digital
https://escoladigital.org.br/

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