Gestão Escolar

Diretora Lúcia Cristina Santos transformou escola vulnerável em espaço de diálogo

Diretora apostou na gestão democrática para acolher crianças até então excluídas da Educação na EM Waldir Garcia, em Manaus (AM)

A diretora da EM Professor Waldir Garcia, em Manaus (AM), Lúcia Cristina Santos, visitou escolas inovadoras e buscou o diálogo com toda a comunidade escolar. Foto: Nidiacris Ribeiro / TrupeFilmes

O bairro São Geraldo, em Manaus (AM), é uma comunidade de alta vulnerabilidade social que, nos últimos anos, passou a receber um número expressivo de famílias haitianas e venezuelanas. Barradas em testes exigidos para o ingresso em outras escolas, essas crianças encontram na EM Professor Waldir Garcia mais do que lousa e conteúdo, encontram acolhida e respeito. 

Desenvolvido em 2019, o projeto Acolher para Todos Envolver e Aprender (da diretora Lúcia Cristina Cortez de Barros Santos - uma das dez vencedoras do Prêmio Educador nota 10) nasceu de um cenário de profunda desigualdade. Além da comunidade imigrante, a escola recebe crianças com distorção idade/série, com deficiência e em situação de risco, todas excluídas do processo escolar. “A partir de muitos desafios educacionais criei o projeto. Não dá para falar em educação sem viver a inclusão, de fato e de direito, de todos os atores envolvidos no processo de aprendizagem”, defende. 

A inclusão rege todas as ações de gestão da escola, pioneira em Manaus no Fundamental 1 em período integral. A partir de visitas a escolas públicas inovadoras em São Paulo, a diretora Lúcia conseguiu implementar uma gestão democrática, desburocratizando relações, estabelecendo vínculos, engajando e dialogando com todos os atores da comunidade escolar. 

Na prática, carteiras individuais foram trocadas por mesas redondas, não há filas ou reprovação. Os resultados de avaliações internas e externas permitem revisar o processo de ensino, pois o foco central é a aprendizagem. As decisões são feitas em assembleias, onde os alunos atuam como protagonistas. Cada uma das 223 crianças escolhe um tutor, que a acompanha até o final do 5º ano. O envolvimento das famílias também é fundamental. Uma das ações é o Temperos do Saber, em que mães ensinam uma receita típica de seu país ou região e contam sua história. “Aproveitamos para trocar experiências e valorizar as diferentes culturas existentes na escola”, conta Lúcia.

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Além disso, a Waldir Garcia optou pelas metodologias ativas que não ensinam somente o conteúdo, mas desenvolvem competências essenciais para realizações na vida pessoal, onde o estudante é o protagonista da sua aprendizagem. “A aprendizagem não pode ser apenas teórica, o conhecimento tem de ser aplicado para solucionar os desafios da vida. Ele precisa ser agente de transformação na sua vida pessoal e no mundo”, defende Lúcia. 

Inclusão, de forma ampla, é o princípio norteador de todo o projeto da diretora da Waldir Garcia, como destaca a educadora e selecionadora do prêmio Educador Nota 10 Maura Barbosa. “O diferencial do trabalho é o movimento encadeado das ações sem perder de vista a aprendizagem dos alunos, rompendo o discurso da impossibilidade e dando visibilidade ao invisível”, afirma. Para ela, todo o projeto é marcado pela real preocupação da diretora e de toda a comunidade escolar com a aprendizagem dos alunos e com o respeito pela condição do outro.  

Maura destaca, ainda, a intersetorialidade do projeto. Na Waldir Garcia houve a articulação com a Unidade Básica de Saúde (UBS) da área, que disponibiliza equipe para acompanhar a saúde das crianças; com o Coletivo Escola Família do Amazonas, organização da sociedade civil que apoia as tutorias; e com as universidades Estadual e Federal do Amazonas, que oferecem oficinas, palestras e estagiários.

Acolher sempre

Mesmo diante da falta de recursos tecnológicos e de acesso à internet, Lúcia adaptou o “Acolher para todos envolver e aprender” para o ensino remoto imposto pela pandemia do coronavírus. Primeiro, foi feita uma campanha para arrecadar tevês, celulares e dinheiro, que foi usado para a compra de equipamentos doados às famílias. “Não podíamos deixar de nos comunicar, de manter o vínculo afetivo e o ensino apesar da distância. Saímos do chão da escola e fomos para o chão das famílias”, relata.

Lúcia conta que também ocorreram visitas pessoais às famílias e a comunidade organizou-se para oferecer ajuda, inclusive com a doação de alimentos. “Continuamos com a rede colaborativa presente para oferecer nossa solidariedade e incentivo para que não desistam da educação”, avalia.

Esse contato próximo é um dos frutos do projeto de Lúcia. “Já trabalhávamos em parceria com as famílias, a comunidade e o terceiro setor, o que está sendo fundamental para atravessarmos este período”, reforça. A diretora conta, ainda, que a educação compartilhada, colocada em prática pelo projeto, estimula a autonomia dos estudantes, o que é de grande valia no ensino remoto.

Na sala de aula ou pelas telas, atuando em questões emergenciais que à primeira vista extrapolam o papel da escola, a dica de Lúcia para os educadores que queiram se inspirar em seu projeto é simples: “Desburocratize as relações. A escola tem de ser um espaço de escuta e de diálogo”, afirma. Para a diretora, o gestor não pode ter postura inflexível, autoritária e centralizadora: “Temos de acabar com a hierarquia e criar relações mais humanas e horizontais, onde as pessoas se sintam acolhidas, formando uma rede colaborativa, um ajudando o outro, num movimento cíclico”.

A seguir, conheça mais detalhes do projeto e inspire-se na prática da diretora Lúcia Cristina Santos.

PROJETO - ACOLHER PARA TODOS ENVOLVER E APRENDER 

Escola: EM Professor Waldir Garcia

Cidade: Manaus (AM) 

Área: Gestão Escolar 

Indicado para: Diretores e coordenadores pedagógicos de turmas do 1º ao 5º ano

Na BNCC: Competências Gerais 9 e 10 da BNCC


PASSO A PASSO 

1. Elabore regras de convivência de cada turma: Tudo deve ser combinado e construído coletivamente com os alunos. As regras devem ficar expostas na sala. 

2. Crie roteiros de estudo e estimule a autonomia: Para as turmas do 3º ao 5º ano, crie roteiros de estudo para dar autonomia aos estudantes. Incentive a pesquisa e o uso da tecnologia, promovendo o desenvolvimento pleno das crianças. 

PONTO DE ATENÇÃO: Os roteiros fazem do educador um mediador, que faz acompanhamento personalizado da aprendizagem, respeitando as diferenças, o ritmo e o tempo de aprender de cada um.

3. Promova a construção de uma cultura colaborativa na escola: Um caminho é a troca do mobiliário, com a extinção das carteiras e a opção por mesas redondas, que facilitam o trabalho colaborativo. Fim das filas e da campainha: a comunicação é feita pela rádio escolar, que também toca músicas.

PONTO DE ATENÇÃO: A presença de crianças haitianas e venezuelanas faz do idioma um desafio na Waldir Garcia. Por isso foram feitas parcerias com a Secretaria Municipal de Educação e com o Consulado da Colômbia para um curso-piloto de espanhol para os estudantes não falantes da língua. Além disso, a escola atua com a Igreja São Geraldo, que fica perto da escola e é local de apoio aos imigrantes. Lá é ministrado o curso de português às famílias estrangeiras. Em parceria com a paróquia, um professor haitiano voluntário ensina crioulo aos funcionários da escola. Há, ainda, o coral dos funcionários em crioulo, que se apresenta na festa intercultural dos imigrantes. 

4. Procure trabalhar em parceria com outras instituições: Trabalhe a intersetorialidade por meio de parcerias com instituições, universidades e agentes públicos. 

5. Aposte no envolvimento das famílias: Uma das ações da Waldir Garcia são os almoços pedagógicos com os funcionários. Nessas ocasiões, os pais assumem todos os serviços da escola. Assim, não há suspensão das aulas e as famílias participam ativamente do fazer pedagógico. 


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