Para colocar em prática

Estratégias para trazer representatividade para a prática pedagógica

É muito importante que as ações antirracistas e em prol da diversidade não se restrinjam ao mês de novembro

Ilustração de crianças participando de uma atividade em área externa da escola. Fotografias de personagens importantes da história africana estão penduradas nos galhos das árvores, enquanto algumas crianças interagem com o tronco da árvore.
Ilustração: Ana Cardoso/NOVA ESCOLA

O dia 20 de novembro é o Dia Nacional da Consciência Negra, data que também deve estar presente no calendário escolar, seguindo a determinação da Lei nº 10.639. Apesar da importância desse dia, é muito importante que as ações antirracistas e em prol da representatividade não se restrinjam a ele ou ao mês de novembro. A escola precisa organizar uma série de estratégias, de ordem prática e dos valores, que reflita o caráter antirracista da instituição durante o ano todo. 

É urgente refletir sobre as abordagens desiguais que a escola faz de algumas culturas, seja por meio da omissão, da folclorização ou do tratar “de qualquer jeito”. Precisamos olhar com complexidade para uma questão que é complexa. As relações étnico-raciais no Brasil são complexas e os professores têm de estar atentos a isso”, comenta Glicia Lins, pedagoga, historiadora e diretora do Espaço de Desenvolvimento Infantil Medalhista Olímpica Poliana Okimoto, no Rio de Janeiro (RJ).

Com esse objetivo, elencamos abaixo algumas estratégias que os professores e gestores da Educação Infantil podem se valer para contemplar a representatividade em suas práticas cotidianas.

1. Valorize e respeite as crianças negras

Um erro comum cometido por professores é reduzir o trabalho em torno das questões raciais ao sofrimento. Segundo Sheila Perina, pedagoga, doutoranda em Educação e cofundadora do Coletivo Luderê Afro Lúdico, em muitos casos as crianças negras são reduzidas a crianças que sofrem racismo. “Os efeitos psicossociais do racismo, de fato, existem, mas as crianças negras são muito mais do que isso. A preocupação das escolas em tematizar o assunto é legítima, mas não podemos fazer essa redução quando há uma série de contribuições culturais e intelectuais das pessoas negras no Brasil e no mundo”, comenta. Ou seja, o olhar dos professores nunca deve ser de compadecimento, mas de valorização de toda a potencialidade que as crianças negras, assim como as outras, apresentam.

2. Reforce exemplos positivos

Nem todos os materiais são uma boa escolha quando o objetivo é investir na representatividade negra. Por exemplo, além de escolher um livro com personagens negros é necessário analisar em quais condições eles são retratados. O professor deve procurar por exemplos em que as pessoas negras sejam protagonistas e apareçam em contextos positivos. “Tenho uma aluna negra que não dizia o que queria ser quando crescer, mas depois que estudamos sobre a covid começou a dizer que quer ser uma cientista porque viu que uma das pesquisadoras que mapeou o genoma do vírus é negra também”, conta Tathiana Gonçalves, professora na EMEI Nelson Mandela.

3. Inclua todas as crianças

Apresentar livros, desenhos, brinquedos e brincadeiras que tragam personagens e o repertório cultural negro é essencial em todas as turmas, mesmo naquelas em que o número de crianças negras é pequeno ou inexistente. Todas as crianças precisam se ver representadas nos materiais que o professor propõe, mas também, precisam entender que na sociedade existem diferenças entre as pessoas. O contato com obras que representem a diversidade humana deve ser incentivado em casa e na escola para que a convivência, o respeito e a valorização das diferenças sejam cotidianos para as crianças.

4. Trabalhe coletivamente

As questões étnico-raciais não devem ser uma preocupação apenas dos professores negros. Todos os funcionários da escola, inclusive os que não trabalham dentro das salas de referência, precisam se sentir responsáveis por isso. A educação antirracista não deve ser vista como um recorte temático, mas como um dos eixos estruturantes do projeto político-pedagógico. Por falta de formação pessoal e profissional, muitos educadores se sentem e, de fato, estão despreparados para lidar com o assunto, mas isso não pode ser motivo para abandonar essa necessidade. É possível pedir ajuda para os colegas e para a gestão, que deve organizar formações sobre o tema.  

5. Ensine com e para a comunidade

A representatividade está diretamente ligada à ancestralidade, por isso é interessante propor projetos por meio dos quais as crianças entrem em contato com a sua história pessoal, de sua família e com as narrativas conhecidas e contadas por elas. O professor pode também propor momentos em que familiares das crianças visitem a escola para contar algumas dessas histórias, e assim a criança verá um membro de sua família sendo valorizado pela instituição e pelos colegas. Portanto, toda a turma entrará em contato com uma história diferente daquela ouvida em casa. 

Por outro lado, caso os responsáveis questionem o fato do professor abordar questões étnico-raciais, é preciso abrir a escola não só para a escuta, mas também para a formação da comunidade. “O professor tem de ter respaldo da gestão para abordar assuntos em sala de aula. A escola também precisa estar disposta a explicar algumas questões sociais para as famílias, que podem ter diversos preconceitos”, comenta Glicia Lins.

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