Para repensar a escola

Para construir a cara da escola

Organizar o ambiente com a participação das crianças favorece a aprendizagem

Luzes, texturas, decoração, cheiros e sonoridade são recursos estéticos que promovem interação. Ilustração: Duda Oliva/Nova Escola

Quando o espaço escolar cumpre a função de acolher, estimular o desenvolvimento e formar a identidade dos pequenos, ele se torna um ambiente educador. Isso se dá por meio de objetos, móveis e decoração organizados para promover bem-estar, oferecer sensação de familiaridade e pertencimento, além de favorecer a independência das crianças. Por essa perspectiva, o espaço é também um elemento educativo. 

O papel do espaço como educador remonta a uma experiência revolucionária iniciada na cidade italiana de Reggio Emilia ao final da Segunda Guerra Mundial, capitaneada pelo pedagogo Loris Malaguzzi e replicada em diversas partes do mundo.

Tempos difíceis podem ser transformadores. A vontade de reconstruir a cidade mobilizou os moradores. Era preciso recriar um mundo melhor e isso viria a partir da educação das crianças. A falta de recursos não impediu a comunidade de se unir em torno de um objetivo maior. Venderam tanques de guerra, cavalos e caminhões deixados para trás por soldados alemães e começaram a construir escolas. O projeto era uma escola sem muros, aberta ao mundo, onde famílias, alunos e professores participam de tudo, onde todos aprendem juntos e o desenvolvimento da criança se dá nos campos intelectual, social e emocional. Entusiasmado com a nova escola que surgia das ruínas, Loris juntou-se  ao grupo. A proposta educacional inovadora ganhou impulso. Saía de cena o professor detentor do saber e ganhava destaque o mestre aberto à escuta da criança e do jovem, sujeito que aprende enquanto ensina. Também começava a se desenhar a ideia do espaço escolar como terceiro educador. 

“O espaço pode ensinar muitas coisas, principalmente aos pequenos que estão na fase de exploração para o desenvolvimento e a aprendizagem”, afirma Roberta Panico, diretora de Desenvolvimento Educacional da Comunidade Educativa Cedac. O modo como a escola organiza objetos e móveis pode levar as crianças a refletirem. “Às vezes, temos a tendência de, por exemplo, retirar do espaço dos bebês determinados objetos capazes de machucá-los, mas podemos planejar intencionalmente sua organização para que os pequenos aprendam a se relacionar com eles”, diz Roberta. “Numa creche, vi berços invertidos (de lado, com o colchão no chão), de modo que os bebês podiam entrar e sair de forma autônoma”, exemplifica.

É preciso organizar todo o espaço com essa intenção educativa, capaz de estimular a imaginação e as capacidades cognitivas, motoras, artísticas, lúdicas, sociais e afetivas. Luzes, texturas, decoração, cheiros e sonoridade são recursos estéticos que promovem interação. Mas, em vez de colar um adesivo pronto na porta da sala, que tal crianças e professores criarem a própria decoração? “Enfeitar o ambiente com personagens de festas infantis não ajuda a construir a identidade, é preciso optar por objetos nos quais as crianças possam se reconhecer. Assim, expor as produções artísticas delas nos corredores da escola, organizar cabides e materiais de modo que executem certas tarefas sozinhas, criar painéis de fotos ajudam a construir a identidade e a desenvolver a autonomia”, defende a educadora. 

A premissa de acolhimento vai além do modo como móveis e objetos são organizados. “Ela inclui as pessoas e suas relações e isso não pode ser planejado somente no início do ano letivo. É algo que precisa se dar continuamente. Acolhimento e apropriação do espaço não podem ser pensados como atividades, mas como princípio de atuação em todo o tempo em que a criança está na escola”, frisa Roberta.

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