PARA REPENSAR A PRÁTICA

Da mãe, avó e tia às notáveis: como valorizar a história das mulheres no Fundamental 1

Antes de apresentar grandes personagens que deixaram sua marca no tempo, pode ser interessante começar pela valorização das mulheres das famílias das alunas e alunos

Ilustração abstrata de crianças olhando para pinturas rupestres na parede.
Ilustração: Ana Carolina Oda/NOVA ESCOLA

Caçadores, desbravadores, conquistadores, lutadores, revolucionários. São termos comuns dos livros de História, quase sempre, senão sempre, no masculino. Mas e o percurso criado pelas mulheres na construção das nossas referências e cultura? Tirar a relevância que elas tiveram nos mais diferentes papéis é um tema que tem ganhado potência entre adultos e adolescentes. Com as alunas e alunos do Ensino Fundamental 1 não deve ser diferente.  

Conversamos com a professora do Ensino Fundamental 1 e cursinho popular Cristiane Paiva para entender as possibilidades de abordagem do assunto com os pequenos. Cristiane é licenciada em Pedagogia e História pela Universidade de São Paulo (USP) e especialista em História, Cultura e Sociedade pela PUC-SP. É também a criadora do podcast Terceira Margem da História, que produz em conjunto com a escritora Paloma Franca Amorim. 

Vamos lá. Uma forma bastante explícita de abordar a relevância da mulher na História é começar pela história das alunas e alunos. Cristiane explica que costuma abordar em uma sequência didática primeiro uma conversa sobre as mulheres que são significativas nas trajetórias das próprias crianças, como mães, tias, avós, vizinhas. Mulheres que elas admiram e que queiram contar suas histórias escrevendo e desenhando. Depois é montado um mural. 

“Em seguida, apresento a elas as histórias de mulheres importantes na história do Brasil e do mundo, como a escritora Carolina Maria de Jesus, Luiza Mahin, Dandara, Nzinga Mbandi”, sugere a professora. 

Ao abordar questões de gênero, é comum aparecer na turma chacotas dos meninos com as meninas ou com alunos que não se encaixam nos estereótipos de masculinidade. Nesse caso, para a professora, é necessário intervir imediatamente, “sem constranger a criança, mas também chamar o grupo para um diálogo em que todos possam opinar, dar sugestões sobre a situação”.

E quando não há subsídio do material didático para abordar o percurso e protagonismo das mulheres na História? Bom, infelizmente, como lembra Cristiane, ainda há pouco material de referência sobre questões de gênero e raciais para as crianças do Ensino Fundamental 1. Por isso, “é fundamental que nós, professores, nos vejamos enquanto pesquisadores e produtores de conhecimento”, pondera. Isso não dispensa troca de conhecimento, ideias e sugestões com os colegas sobre o que pode ser feito com os alunos. 

Brincadeiras, músicas e livros para fugir dos estereótipos

Para essa faixa etária, que costuma ir dos 7 aos 11 anos, brincadeiras, músicas e a leitura de livros infantis ainda são as abordagens mais apropriadas e eficientes. As crianças estão na fase de construir intensamente seu repertório, e pode parecer estranho, portanto, questionar a História, que tem, como ponto de vista central, a perspectiva patriarcal, de poder e liderança apenas do homem. Mas quem trabalha o tempo todo com elas sabe: desde muito cedo elas percebem a sociedade que as rodeia, e reforçam ou questionam os estereótipos. 

“As proibições são impostas às meninas, e o exercício de certo tipo de masculinidade é imposto aos meninos. Acredito que seja importante discutir com elas e não relativizar essas imposições. Afinal, observarmos na sociedade agressões e assassinatos que muitas vezes são fruto do machismo e patriarcalismo impostos desde a infância”, afirma. 

Nesses momentos, a professora sugere que sejam feitas intervenções com conversas e questionamentos a respeito do porquê os alunos pensam dessa forma. E propõe experimentações básicas, como meninos brincando de casinha e meninas jogando futebol. 

Confira, abaixo, duas sugestões de livros que podem ampliar o repertório dos alunos sobre o percurso das mulheres na história do Brasil.


Extraordinárias: Mulheres que revolucionaram o Brasil
Aryane Cararo e Duda Porto de Souza, Editora Seguinte, 323 págs., R$ 44,90

Por que ler: Resultado de extensa pesquisa, a obra conta a história de grandes brasileiras, tais como a guerreira Dandara, do Quilombo dos Palmares, a arqueóloga Niède Guidon (saiba mais sobre sua trajetória aqui) e a ativista trans Indianara Siqueira. São retratadas mulheres de diferentes etnias e origens, que deixaram suas contribuições para o Brasil do século 16 à atualidade.


50 Brasileiras Incríveis para Conhecer Antes de Crescer
Débora Thomé, Galera, 120 págs., R$ 53,86

Por que ler: Neste livro, a jornalista e cientista política Débora Thomé reúne a biografia de grandes mulheres brasileiras, todas ilustradas também por artistas mulheres. São diversas heroínas da vida real, como Maria Quitéria, primeira mulher a integrar o Exército Brasileiro, e Marta, eleita a melhor jogadora de futebol do mundo por seis vezes.


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