Novidades olímpicas são um campo rico para o trabalho escolar
Conheça algumas possibilidades de aprendizagens, em diversos componentes curriculares, usando pontos que aparecem pela primeira vez no evento
São tantos detalhes envolvendo a realização de uma Olimpíada, que temas férteis em aprendizagem possíveis não faltam. A localização geográfica do torneio, sua origem e transformações ao longo do tempo, os fatores políticos, sociais e culturais que o afetam e a ciência relacionada ao desempenho dos atletas são apenas alguns deles. “Dá para propor um trabalho interdisciplinar envolvendo toda a escola, como pedir para que os estudantes produzam o megaevento para o ambiente escolar e, para isso, tenham de elaborar valores olímpicos próprios, decidir os critérios para escolha dos esportes, pensar em como propiciar equidade e no significado dos símbolos escolhidos, como os mascotes”, explica Tereza Perez, diretora-presidente da Comunidade Educativa Cedac.
Segundo a pesquisadora, trabalhar com alunos das diversas etapas de ensino em conjunto, em que os aprendizados vão se dando também na convivência e troca entre eles, é muito enriquecedor. “No contexto remoto, os estudantes que tinham irmãos em casa acabavam compartilhando o momento da aula com eles. Talvez isso seja algo que possa ser incorporado depois da volta ao ensino presencial." Para ampliar ainda mais o campo de atuação docente com o tema Olimpíada, veja sugestões de como usar as novidades deste ano para abordar habilidades da BNCC em diversas áreas do conhecimento e também interdisciplinarmente.
Equilíbrio histórico entre gêneros - Com 49% de atletas mulheres, segundo dados do Comitê Olímpico Internacional (COI), esses serão os Jogos mais equilibrados entre os dois sexos da história do torneio. Também é a primeira vez que o evento conta com uma esportista transexual competindo. “O trabalho envolvendo gênero está presente, por exemplo, quando se estuda o sistema reprodutor e hábitos de higiene pessoal em Ciências nos anos iniciais. Nessa faixa etária, é comum ver episódios de ofensas entre colegas usando expressões machistas e homofóbicas, por isso o tema também permeia diversas competências gerais da BNCC, como as relacionadas ao respeito, à cidadania, à argumentação, à empatia e ao conhecimento científico”, coloca Maiara Ariana Silva Paula, mestre em Educação pela Universidad del Salvador, em Buenos Aires, Argentina, e formadora da Secretaria de Educação de Guarulhos (SP). Maiara lembra que já há documentos escolares, como os destinados a alunos de Educação de Jovens e Adultos (EJA), em que existe um campo de preenchimento com o nome social do estudante, caso ele deseje utilizá-lo.
Inclusão das modalidades surfe, skate, escalada esportiva, caratê e beisebol - Apesar de as práticas corporais de aventura, por exemplo, estarem descritas na BNCC dentro das propostas dos anos finais do Ensino Fundamental para a Educação Física, é perfeitamente possível trabalhá-la nos anos iniciais, respeitando a etapa de desenvolvimento das crianças. Foi o que fez a professora Cybele Câmara da Silva na Escola João Paulo II, em Natal (RN). Cybele elaborou uma sequência didática em que a turma do 4º ano pôde experimentar os gestos e desafios da escalada dentro do ambiente escolar. “Com planejamento e orientações claras de segurança, os alunos subiram por portões da escola, grades da quadra de esportes e simularam os movimentos de uma parede de escalada com os desenhos dos apoios feitos no chão. Também confeccionamos escadas de corda e uma rede feita com pneus para continuar as vivências mesmo após a finalização do projeto”, conta a docente, que ficou entre os 50 Educadores Nota 10 de 2020 (confira uma atividade proposta pela docente).
Inclusão das novas modalidades paralímpicas badminton e tae kwon do - Em uma perspectiva inclusiva, questões ligadas às pessoas com deficiência (PcD) devem fazer parte de todas as instâncias escolares, que vão desde a organização do espaço até o trabalho com os componentes curriculares. Uma proposta válida para Geografia é tratar da mobilidade urbana pelo viés do esporte, em uma investigação sobre como viabilizar que um atleta olímpico exerça sua potencialidade ao máximo, minimizando os obstáculos relacionados à sua mobilidade. “É possível desenvolver a empatia e o olhar para os direitos de pessoas com deficiência como cidadãos”, diz Maiara. Já em Educação Física, uma sugestão é trabalhar os recursos corporais, estratégicos e materiais necessários envolvendo um mesmo esporte nos âmbitos olímpico e paralímpico. Por exemplo, para jogar badminton, como um atleta cadeirante se movimenta na quadra? E um jogador que não usa cadeira de rodas? Que gestos cada um deles tem de fazer para jogar? Que movimentações devem ser combinadas para rebater e se locomover em quadra? As regras são as mesmas para as duas situações? O que muda? E os instrumentos usados, como a raquete, têm as mesmas características nos jogos olímpico e paraolímpico? “O caminho não é falar de limitações ou dificuldades, mas focar nos recursos que são desenvolvidos para fazer aquela atividade”, enfatiza Marcos Mourão, professor do Espaço Ekoa e selecionador do Prêmio Educador Nota 10.
A sede olímpica no Japão - Além de a ampliação de Repertório Cultural ser uma das competências da BNCC, analisar diferentes fluxos populacionais e suas contribuições para a formação da sociedade brasileira faz parte dos conhecimentos a serem desenvolvidos nos anos iniciais do Ensino Fundamental. Portanto, a imigração japonesa, com a consequente influência cultural no país, pode ser foco de investigação em História, comparando informações transmitidas pela mídia com os elementos culturais identificados no Brasil.
Diferença grande de horário - Tóquio, no Japão, está 12 horas à frente de Brasília, em termos de fuso horário. Ou seja, um jogo que acontece de manhã é transmitido já de noite em terras brasileiras, o que pode gerar grande curiosidade entre as crianças. Partir dessa informação para propor uma investigação sobre os movimentos de rotação e translação da Terra - que é parte das aprendizagens previstas em Geografia nos anos iniciais – é bastante significativo. Já em Matemática, é possível trabalhar com cálculos envolvendo a descoberta do fuso horário de torcidas em diferentes países. “Nem o professor sabe os fusos de memória. Ele precisa observar e calcular. Por isso, um projeto interdisciplinar com Geografia e Matemática faz sentido. Os alunos são pesquisadores, tanto quanto os educadores”, reflete Maiara.
Fato de o torneio ter sido adiado do ano de 2020 para 2021 - Atividades de calendário são realizadas desde a Educação Infantil e ganham sentido quando ele é usado como instrumento de organização da agenda e do tempo, assim como ocorre na vida cotidiana de crianças e adultos. Propostas matemáticas de cálculo de quantos dias faltam entre um jogo e outro, por exemplo, são úteis para os alunos se organizarem para assistir aos esportes que mais gostam. Reconhecer as unidades básicas de tempo – como dia, mês e ano, além da noção de dia e noite – é uma habilidade prevista em Ciências. "O trabalho com calendário também pode ser usado em uma perspectiva da competência geral Trabalho e Projeto de Vida, pois os atletas que estavam prontos para a Olimpíada em 2020 tiveram de reorganizar todos os seus treinos e datas para estarem aptos a competir este ano. Como será que eles se organizaram? Qual era o objetivo e o que tiveram de fazer para atingi-lo? Como planejaram os próximos passos?", lembra Maiara.
Existência de protocolos para prevenção de covid-19 - A comunicação para os frequentadores do megaevento – por diferentes ferramentas e formatos – sobre procedimentos e comportamentos necessários neste momento de pandemia pode ser incluída no planejamento pedagógico de Língua Portuguesa, com trabalho realizado em conjunto com a área de Ciências. Vale responder às questões: em um evento de grande porte como a Olimpíada, como fazer com que todos saibam os protocolos de saúde adotados? Que informações devem ser disponibilizadas? Onde buscá-las? Que recursos podem ser utilizados para comunicá-las da maneira mais eficiente (como sinalização e informativos)? As diferentes tecnologias e a capacidade de se comunicar permeiam o processo de aprendizagem. É possível, também, envolver a realização de cálculos de área e capacidade de pessoas (público em cada esporte), com base nos critérios de distanciamento adotados como medida para minimizar a transmissão do vírus.
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