3º ao 5º ano: 5 pontos para superar a defasagem e planejar as aulas de Língua Portuguesa na volta às escolas
Foco em atividades comunicativas e de leitura e produção de texto, cuidados com a consolidação da alfabetização e com a transição para os Anos Finais são fundamentais no retorno
As turmas de 3º, 4º e 5º ano do Ensino Fundamental têm suas especificidades e precisam ser olhadas com especial atenção no segundo semestre. Além da necessidade de o professor ter uma avaliação detalhada sobre como foi o primeiro semestre no contexto remoto ou misto, é importante considerar que esses anos podem ser considerados inícios e finais de ciclos fundamentais para a criança.
Pensando nisso, NOVA ESCOLA convidou três especialistas do seu Time de Autores para apontar o que é essencial levar em consideração na hora de planejar as aulas de Língua Portuguesa para os estudantes desses anos, levando em consideração o momento de cada turma. São elas: Kátia Chiaradia, formadora de professores, desenvolvedora de materiais escolares de literatura e consultora deste Box; Mazé Nóbrega, professora de pós-graduação do Instituto Vera Cruz, em São Paulo (SP); e a formadora de professores Renata Capovilla.
Acolhimento, adaptação, mapeamento e avaliação
Assim como nos primeiros dois anos do Ensino Fundamental, é preciso reservar um período para o acolhimento e a avaliação diagnóstica com o objetivo de compreender o momento de desenvolvimento de cada um dos estudantes.
“Qualquer novo passo na educação precisa de uma avaliação diagnóstica, só que a expressão "avaliação diagnóstica" dá medo, porque parece que são apenas aquelas avaliações externas que a rede tem de fazer. Essa avaliação a que me refiro é um levantamento ou mapeamento de saberes das crianças”, explica. Segundo Kátia, é fundamental que o professor reserve uma semana (ou até duas se sentir necessidade) para promover vivências e experiências em que os estudantes possam mostrar o que sabem e o que também não sabem dentro das quatro práticas de linguagem.
Para auxiliar nesse processo, Katia produziu um material que auxilia o professor na hora de identificar o que já foi trabalhado no semestre anterior e, dentro das habilidades consideradas prioritárias, devem ser o foco da segunda metade do ano letivo. Renata preparou um vídeo explicativo de como o material pode ser utilizado.
Foco na comunicação e em práticas de leitura e produção de texto
Mazé ressalta que a BNCC prevê mais de 70 habilidades a serem desenvolvidas em Língua Portuguesa em cada ano do Ensino Fundamental 1, e que os materiais didáticos costumam ter muito conteúdo em relação à compreensão de análise linguística, porém o professor não precisa abraçar tudo.
“Nessa volta, eu colocaria maior peso nas questões mais comunicativas, nas práticas de leitura e nas práticas de produção de texto que tenha também mediação da produção oral”, diz.
Um exemplo dado pela especialista é desenvolver uma atividade sobre lendas com a criança. “Eu proponho que a criança reconte uma lenda conhecida por escrito, mas antes, peço que ela faça isso oralmente ou que a turma faça um recontural coletivo”, explica. “Outro modo de trabalhar a Língua Portuguesa numa atividade sob essa temática seria o professor gravar esse recontural, transcrever e, depois, fazer uma revisão coletiva para transformar aquele texto cheio de notas de oralidade em escrita. Assim a oralidade serve como ponte para a atividade principal.”
Segundo Mazé, mais importante que trabalhar a gramática de natureza descritiva neste momento é o professor focar nas situações e atividades que têm impacto no uso.
3º ano: De olho na alfabetização e ortografização
O terceiro ano é um período importante para as crianças porque este representa um período em que a alfabetização é consolidada para os alunos. Segundo Kátia, trata-se do período em que a ortografização é mais presente, uma consolidação da alfabetização da criança em que o papel do professor é auxiliar os alunos a fixarem algumas regularidades da língua – por exemplo, o uso dos plurais dentro da norma culta ou a troca de letras, como o “u” pelo “l”, do “c” e do “ç”, entre outras tantas normas.
Com a pandemia e o ensino remoto, entretanto, o professor precisa levar em conta que nem toda criança completou o ciclo de alfabetização de maneira adequada e precisará que o professor retome as aprendizagens que estavam previstas para os dois primeiros anos do Ensino Fundamental.
“Antes os professores do 3º ano estavam preparados para trabalhar com ortografização, só que essa criança não foi alfabetizada como se esperava. Então, agora ele precisará desenvolver estratégias de alfabetização também”, explica a consultora.
Segundo ela, é fundamental que o educador converse com colegas dos anos anteriores, especializados em alfabetização. “O professor de 3º ano vai ser muito solicitado a ter de aprender uma coisa nova, pois ele não é um professor alfabetizador em princípio. Ele vai ter de aprender a alfabetizar, vai ter de conversar com o professor de 1º e 2º ano e aprender estratégias de alfabetização. Ele não pode simplesmente olhar para as habilidades previstas para o 3º ano.”
4º e 5º anos: Olhando para a transição
Já os estudantes do 4º e 5º ano têm outros desafios que precisam ser levados em conta na hora de planejar o segundo semestre, aponta Kátia. “São os últimos momentos da criança nos Anos Iniciais. Por isso é importante preocupar-se com um elemento bastante caro para a Base Nacional Comum Curricular (BNCC), que é a transição. Uma criança de 5º ano tem poucos meses para se preparar para um novo momento. Inclusive, em muitos casos, para uma nova escola. Ela não teve tempo de se despedir dos colegas, não viveu tudo aquilo que precisava ser vivido nos momentos finais da infância, rumo à adolescência”, explica.
Por isso, ela explica que, como professora, não focaria nas aprendizagens traduzidas em habilidades, mas sim, em outros elementos fundamentais, voltados para o amadurecimento da criança, que vai prepará-la para a nova etapa que a espera. “Recomendo que priorizem muito a interação entre as crianças, porque elas amadurecem pela troca. Do contrário, ficará um buraco que vai fazer falta lá na frente.”
Atividades permanentes de Língua Portuguesa podem ser uma boa saída para isso, diz. Por exemplo, nas segundas-feiras o professor pode fazer uma roda de leitura de um livro literário, em que cada aluno lê um trecho. Nas terças, a leitura pode ser de uma notícia de jornal, promovendo um espaço de debate e de escuta em que o aluno poderá expressar o que pensa a respeito daquela reportagem enquanto os colegas escutam, entendem como o outro pensa e aguardam seu momento de também falarem. “São atividades que podem durar meia hora, mas que permitem a essa criança a oportunidade de estar em grupo, de se perceber como parte dele e de poder se despedir da turma”, reflete.
Outro ponto que a interação promove é o contato com a pluralidade. Conviver e conhecer gostos diferentes dos seus é uma maneira de abrir espaço para o desenvolvimento.
Troca com os pares
Seja qual for o ano para o qual o professor lecione, Mazé ressalta que é fundamental que a educadora ou o educador compreendam que esse retorno das aulas presenciais deve ser encarado como um processo coletivo, como foi o ensino remoto no início da pandemia, e que a troca entre os professores é essencial para a criação de estratégias que abarcam todas as crianças.
“O professor precisa entender que esse não é um problema solitário, dele com a sua turma. É um problema de todos, da escola. Sabemos que isso foi algo que os professores precisaram desenvolver na pandemia, formando grupos para pensar nas atividades, aprender a usar as ferramentas tecnológicas. Manter esse espírito, de que a escola é um coletivo, é importante. E quanto mais a gente consegue lidar com os problemas de forma coletiva, mas a gente vai se sentir apoiado e encorajado”, ressalta.
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