Para repensar o ano

Educação Física: 5 respostas para replanejar 2020 no Fundamental 2

Conheça alguns caminhos para redesenhar o ano letivo com as turmas do 6º ao 9º ano

Recomendação é não tentar reproduzir a distância a mesma metodologia das aulas presenciais. Ilustração: Nathalia Takeyama/Nova Escola

A reviravolta causada pela pandemia da covid-19 afetou profundamente o mundo da Educação. No caso dos professores de Educação Física, o impacto parece ter sido ainda maior: o componente curricular precisou de uma verdadeira reinvenção para ser aplicado ao modelo de aulas remotas. Neste contexto, como conduzir uma reavaliação do que foi planejado no início do ano para continuar apoiando a aprendizagem dos alunos do Fundamental 2?

Professores da área avaliam que a parada forçada nas aulas presenciais é uma oportunidade para repensar como as Habilidades e Competências propostas pela Base Nacional Comum Curricular (BNCC) para a Educação Física têm sido oferecidas no Fundamental 2. Uma preocupação geral é tornar crianças e adolescentes protagonistas do seu aprendizado.

Para apontar alguns caminhos para o replanejamento, conversamos com o especialista Luis Henrique Vasquinho, professor de Educação Física, pedadogo, responsável por fazer a leitura crítica da BNCC para a Educação Física no Ensino Médio e consultor de todos os conteúdos desta caixa. Ouvimos ainda Mário Pereira Neto, professor de Educação Física da Escola da Vila; Isabel Filgueiras, professora da pós-graduação da Universidade São Judas; e Washington Nunes, coordenador de Esportes da Escola da Vila. Confira abaixo as respostas:

1. Por onde começar o replanejamento para as aulas de Educação Física com as turmas do 6º ao 9º ano?

Os especialistas consultados relatam que os professores de Educação Física não devem tentar reproduzir a distância a mesma metodologia e os mesmo conteúdo das aulas presenciais.

“É o momento de reavaliar o ensino, de propor atividades que façam sentido no cotidiano dos alunos”, sugere Isabel Filgueiras. O conteúdo proposto deve ter como objetivo ajudar o estudante a olhar para o próprio corpo, a desenvolver uma cultura corporal de fato – situação que se torna ainda mais necessária num contexto de saúde/doença.

Um exemplo: os jogos de futebol, restritos durante a quarentena. O aluno que gosta do esporte pode ser instigado a pensar: como se sente em relação a isso? O que tem feito para suprir essa ausência? O que a falta de exercício acarreta para sua saúde? Se ele gosta de jogar, o que faz para dar conta dessa vontade?

Pensar nessas questões, segundo os especialistas, pode fazer os alunos se sentirem parte de um problema conjunto, que não atinge só a eles. As soluções também têm de ser coletivas: ver como os colegas têm feito sem poder jogar na rua ou numa quadra, pesquisar e analisar as saídas encontradas por pessoas de outras localidades etc.

O exemplo do futebol pode ser substituído por qualquer outro. “É uma maneira de colocar o aluno como protagonista do momento que estamos vivendo”, diz Luis Vasquinho.

Na pandemia, mais do que nunca, ficou evidente que só ouvir o que o professor tem a dizer, especialmente na Educação Física, não funciona. A busca por soluções é fundamental para o aprendizado. Segundo os especialistas, a BNCC pressupõe o desenvolvimento de uma série de competências. E uma pessoa competente, para resolver obstáculos, precisa mobilizar conhecimentos, atitudes e habilidades. Se falta algo, como o conhecimento para solucionar uma questão, ele precisa ir atrás. “O que precisamos fazer é investir nesse modelo de fato”, diz Isabel.

2. Nas aulas de Educação Física a distância, que tipo de atividade ou conteúdo é mais adequado ou possível de ser desenvolvido?

O aluno tem de trabalhar com a realidade dele. Alguns moram em casas espaçosas, outros dividem um cômodo com mais pessoas. O professor de Educação Física não pode perder isso de vista – mas, dentro dessa lógica, é possível pensar em muitas possibilidades. Para o Fundamental 2, exercícios que trabalhem a coordenação motora, força e resistência estão no currículo. A maioria terá de realizá-los com materiais alternativos. No lugar de um cone, por exemplo, pode colocar outro objeto. Para força, pode se valer de outros recursos, como levantar garrafas pet com água. “O professor precisa orientar para evitar um acidente, para que o aluno não se lesione, mas deve estimular que ele encontrem opções para realizar o que foi proposto.

O exemplo do futebol também pode ser aplicado: o aluno tem alguma ideia para praticar o jogo na quarentena dentro do espaço em que vive? Vale conhecer ainda a proposta da Escola da Vila, em São Paulo, para engajar pais e familiares no ensino remoto. A instituição criou, em seu perfil no Instagram, um horário para uma aula de exercício físico ao vivo, em que todos praticam. “A inatividade física dos adolescentes durante esses meses é algo preocupante. A aula em família e outras atividades buscam quebrar isso e fazer todos pensarem na importância do exercício”, explica Washington Nunes.

3. Como estimular a interação entre os alunos nessas atividades remotas?

Algumas escolas têm apostado em aulas síncronas uma ou duas vezes por semana, com toda turma. Outras têm solicitado aos alunos que trabalhem em pequenos grupos, via WhatsApp, por exemplo. Uma ideia sugerida por Luis Vasquinho é dar a cada grupo a tarefa de pesquisar sobre uma atividade corporal (jogo, dança, luta, etc.).

Cada grupo deve encontrar uma solução para a prática do exercício no espaço em que se encontra. Precisam pensar em materiais, se for o caso, em como se movimentar num ambiente restrito. “Eles são forçados a usar a criatividade. Nesse exercício, também vão se dar conta dos diferentes modos de morar e das dificuldades e saídas de cada um para se movimentar”, avalia Vasquinho. Ao final, os alunos filmam ou relatam sua pesquisa e atividade e apresentam para os outros da sala, trocando vídeos pelo WhatsApp (ou outra plataforma) sobre suas experiências.

4. Como posso avaliar o aprendizado dos meus alunos remotamente ao longo da quarentena?

A avaliação tem de ser feita com base em outro modelo, diferente do escolarizado. “Este ano letivo não é igual aos outros: se o professor partir dessa premissa no aprendizado e na avaliação, todos saem ganhando”, acredita Isabel Filgueiras. O aluno tem de ser avaliado pelo processo e, mais do que em outras circunstâncias, pelo o que conseguiu fazer dado o seu ambiente, seu acesso à tecnologia, seu envolvimento com o conteúdo apresentado. Como o aluno resolveu o problema proposto? Como foi seu percurso? Trouxe soluções, como se espera num trabalho que envolva competências? Uma ideia é também investir muito na autoavaliação, como vários especialistas têm feito. “O professor precisa acolher e ouvir o aluno”, afirma Mário Pereira Neto.

5. Como posso começar a me preparar e planejar uma eventual volta às aulas?

A volta às aulas presenciais deve ser tratada durante os meses de ensino remoto. Em São Paulo, a expectativa é de que as atividades devem ser retomadas em setembro, por exemplo. Para Mário Pereira Neto, a segurança dos alunos vai depender muito do engajamento deles com essa questão. No Fundamental 2, acredita, os alunos já têm consciência dos riscos, entendem a necessidade do distanciamento, da higienização das mãos. “Um retorno tranquilo está muito associado ao quanto os professores falam sobre essa dinâmica nas aulas remotas”, afirma. Levantar problemas em relação a isso e ver como eles resolvem, que soluções apresentam, é uma forma de aproximá-los da realidade, de exercer a empatia em relação ao colega e de construir caminhos para a escola dentro desse cenário. “O acolhimento no retorno, ouvindo as dúvidas e lidando com a ansiedade dos alunos e familiares, também é uma forma de se preparar para as aulas presenciais”, diz Washington Nunes.

Algumas escolas, que voltarão com menos alunos por turno, pensam em oferecer práticas corporais em que os alunos façam sozinhos (alongamento, exercícios de força e flexibilidade), em espaços ao ar livre, se possível, em áreas demarcadas, com a adequada higienização de mãos, dos sapatos e de materiais utilizados. Isso é interessante porque, de forma geral, os alunos ficaram mais sedentários no isolamento. A atividade física deve ser retomada de forma moderada. De olho na retoma presencial, Vasquinho sugere que os alunos sejam envolvidos na tarefa de pensar sobre o ensino da Educação Física em tempos de isolamento: “Sugerir uma tarefa em que eles avaliem que jogos podem fazer no retorno sem risco, de que forma devem se deslocar pelos espaços da escola com segurança, como se relacionar com os colegas, como cuidarão da higiene, entre outras questões”.

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