Pantanal: Materiais para entender as queimadas e abordá-las em três disciplinas
Sensível e com rica biodiversidade, bioma sofre com onda de incêndios em 2020. Preparamos fotos, dicas e uma ficha com informações básicas da região
Há pouco mais de dois meses, imagens do fogo consumindo a fauna e a flora do Pantanal circulam pelo mundo. Chocantes, os registros em fotos e vídeos mostram animais carbonizados, vegetações destruídas, incêndios e, mais recentemente, a cor alaranjada que tingiu o céu das regiões brasileiras afetadas pela fumaça. Para quem não está em Mato Grosso ou Mato Grosso do Sul, estados que abrangem o bioma (saiba mais sobre ele na ficha informativa abaixo), as fotos e os vídeos parecem saídos de um filme de terror. A diferença é que as cenas de destruição são bastante reais.
Maior planície contínua alagada do mundo, o Pantanal é o hábitat de 4,7 mil espécies de plantas e animais. No entanto, essa rica biodiversidade encontra-se ameaçada: registraram-se algo em torno de 5,8 mil focos de incêndio até o dia 21 de setembro, de acordo com informações do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), fazendo desse mês o mais catastrófico do ponto de vista ambiental para o bioma. Ainda segundo dados do Inpe, em 2020 já foram detectados perto de 16 mil focos na região, 70% deles somente entre agosto e setembro, maior número já registrado desde o começo do monitoramento, em 1998.
Esses dados levantam diversos questionamentos, mas a pergunta aqui é: por que está havendo tanto fogo no Pantanal neste ano?
"O que está acontecendo no Pantanal não é um processo natural, mas criminoso”, afirma Leandro Holanda, mestre em Ciências pela Universidade de São Paulo. Entre as causas elencadas pelo especialista para o aumento de queimadas na região estão a falta de políticas públicas para o combate aos incêndios, a postura do governo federal em não priorizar a preservação ambiental e também a seca prolongada na região, o que aumenta a possibilidade de expansão dos focos de incêndio.
Para Murilo Vogt Rossi, doutor em Ensino de Geografia e Cartografia pela Universidade Federal da Paraíba (UFPB), a situação do Pantanal é, no mínimo, estranha, “pois trata-se de um bioma alagadíssimo”. “Queimar o Pantanal nos deixa com várias dúvidas e nos leva a pensar em incêndios criminosos causados por fazendeiros e latifundiários, pessoas com interesses tanto na questão fundiária quanto na expansão agropecuária, principalmente com a soja e o gado”, pontua.
O tema é urgente e relevante – também para a escola. Por isso, NOVA ESCOLA ouviu especialistas em três componentes curriculares e preparou dois materiais de apoio para você utilizar com seus alunos: uma galeria com imagens que dão a dimensão da tragédia ambiental; e uma ficha com informações básicas sobre o Pantanal, que pode servir como ponto de partida ou arquivo de consulta para a turma.
- Veja a galeria:
- Clique no botão abaixo para baixar a ficha informativa sobre o bioma Pantanal:
- Agora, veja as sugestões de Leandro Holanda, Murilo Rossi e Luciana Tenuta, especialistas em Ciências, Geografia e Matemática do Time de Autores de NOVA ESCOLA:
Como abordar os incêndios no Pantanal na aula de Ciências
De acordo com a Base Nacional Comum Curricular (BNCC), as possibilidades de abordagem vão desde habilidades relacionadas aos biomas à biodiversidade e locais de preservação, localizadas especialmente no 9º ano, segundo Leandro. A sugestão é de que o professor, além das habilidades, olhe também para Competências Gerais da BNCC como Responsabilidade e Cidadania. “Independentemente de ter ou não habilidades nos anos que vão tratar esse assunto, podemos trazer esse tema relacionado ao desenvolvimento dessa competência”, diz Leandro.
O educador acrescenta que levar esse tema para as aulas de Ciências é importante, sim, porque, muitas vezes, ao falar em preservação ambiental de um local que não conhecemos há uma tendência em tornar a discussão muito rasa, pautada em discursos como “plante uma árvore”. “Não é necessariamente isso que a gente precisa para manter um bioma, pois, não adianta eu plantar uma árvore no meu quintal se tenho quase 20% do Pantanal queimado”, enfatiza. Um bioma representa um conjunto de espécies, de fauna e flora específicas. Por isso, Leandro reforça que é crucial que os alunos primeiro conheçam para, depois, poder entender, também, o que é preservar o bioma de fato.
Como abordar os incêndios no Pantanal na aula de Geografia
A primeira dica de Murilo para trabalhar o tema das queimadas nas aulas de Geografia é desconstruir a ideia de que o fogo em si é o grande vilão da história. Ele observa que as queimadas são uma prática milenar e que comunidades tradicionais ainda utilizam técnicas como a coivara. O que não significa, porém, que são culpadas pela devastação ambiental observada agora.
“Aí entra a questão da intencionalidade [das queimadas] e isso pode ser demonstrado por meio dos dados de órgãos e instituições, tais como IBGE, Ibama, Inpe e ICMbio, que têm recursos incríveis para se trabalhar com os estudantes”, ressalta Murilo. O professor sugere também propostas que trabalhem com coleta, medição e comparação de dados para que os estudantes possam pensar criticamente sobre o assunto. Para 6º e 7º ano, a recomendação do educador é apostar em dados e imagens sobre o atual contexto das queimadas. Já questões políticas e dados mais complexos – como as causas dos incêndios e os fatores sociais e econômicos envolvidos – podem ser trabalhados no 8º e no 9º ano.
Outro caminho é trabalhar com as notícias falsas que circulam sobre o tema na internet, como acontece com a maioria dos assuntos polarizados. Murilo recomenda que o professor busque boas fontes de informação (veículos de imprensa tradicionais, órgãos oficiais etc.) e aborde esses aspectos antes e durante as aulas.
Além de utilizar reportagens que vêm sendo publicadas pela imprensa, você pode utilizar depoimentos como este, concedido a NOVA ESCOLA pelo jornalista Lázaro Thor Borges, que acompanha os acontecimentos.
“No meio de toda a destruição do Pantanal, encontrei esperança nos voluntários, nos pantaneiros, que ficam dia e noite monitorando o fogo, nos guias e nos agentes do Corpo de Bombeiros. O que a gente vê fora das pessoas, nas paisagens, é uma imagem desoladora. Isso ficou muito claro para mim quando acompanhei o resgate de uma onça-pintada no Parque Estadual Encontro das Águas, um macho jovem encontrado com as patas queimadas. A onça-pintada é símbolo de força e beleza, mas ao ver o animal naquela situação, no meio daquele fogo todo, vi essa força enfraquecida e essa beleza diminuída. De tudo isso, ficou na minha cabeça a capacidade que os pantaneiros têm de resistir, mesmo que o incêndio seja um evento tão incomum. Ficou em mim a impressão de uma força e de uma beleza enfraquecidas, mas uma esperança ainda muito forte entre todos que estão lá.”
Como abordar os incêndios no Pantanal na aula de Matemática
Campos de futebol, quarteirões, fazendas, cidades. Quais referências podem ser usadas para fazer com que os alunos dimensionem uma área afetada pelas queimadas no Pantanal?
Esse pode ser um dos ganchos para abordar o assunto nas aulas de Matemática, segundo Luciana Tenuta, mestre em Ensino de Matemática pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC-MG). Na BNCC, o conteúdo a ser trabalhado será a unidade temática Grandezas e Medidas.
“Na Matemática, podemos investigar se o aluno consegue estimar áreas grandes, estabelecer relações entre essas grandes áreas e dar significado a elas. Isto é, quando começar a ler uma notícia, para que isso perdure e seja de fato uma habilidade desenvolvida, o estudante precisa ter essas noções em qualquer momento da vida dele. Assim, ao ouvir determinado número sobre uma área, vai conseguir dar significado para isso”, explica Luciana. Uma dica interessante é usar referências que façam sentido para a realidade do aluno. Por exemplo, se ele vive na zona rural, usar uma fazenda para dimensionar o tamanho de uma área pode fazer mais sentido que um quarteirão. Além disso, nesse caso, em vez de usar quilômetro como unidade de medida, outra opção é trabalhar com hectare, que é mais usual em áreas rurais. “Isso é humanizar a Matemática”, reforça.
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