Saiba o que é sala de aula invertida e como ela estimula a autonomia dos estudantes
Prática usada no ensino híbrido pode oferecer contribuições para as aulas realizadas no formato de ensino remoto durante a pandemia
Apesar das dificuldades mapeadas por professores e alunos em todo o país durante a pandemia, o ensino remoto ressaltou a importância da autonomia na aprendizagem. A aula expositiva foi novamente colocada em xeque e o isolamento exigiu dos alunos maior engajamento.
Agora, com a volta gradual dos encontros presenciais, aulas baseadas e inspiradas em alguns modelos do ensino híbrido poderão potencializar a aprendizagem dos estudantes. Um desses modelos se destaca: a sala de aula invertida.
E como ela funciona? Na sala de aula invertida, o professor seleciona e envia, antes da aula presencial, materiais de estudo ou tarefas para os alunos explorarem o tema que será desenvolvido. Podem ser vídeos (filmes, documentários), textos (reportagens, artigos jornalísticos), áudios (podcasts) ou até imagens (galerias de fotos e arquivos em formato PDF). Daí, com esse estudo prévio realizado pelos estudantes, o docente elabora a aula utilizando os conceitos que eles aprenderam, com ênfase especial àquilo que o aluno construiu após ter tido contato individualmente com aqueles conceitos. A “inversão” é justamente esta: enquanto, nos modelos tradicionais, a aula presencial é usada para aprender a teoria e os estudantes levam as tarefas práticas como lição de casa, no modelo invertido, a teoria é vista individualmente antes da aula e as atividades, feitas na classe.
“[A sala de aula invertida proporciona] um espaço maior de reflexão e de concentração quando o aluno está em casa, aliado à ideia de explorar bastante a ação e a presença do estudante durante o encontro físico”, avalia a coordenadora de Licenciatura em Matemática do Instituto Singularidades, Margareth Polido Pires. Para ela, nas turmas do Ensino Fundamental 1, a inversão pode ter um caráter mais de atividade preparatória, enquanto no Fundamental 2, a busca é por estimular que o aluno traga contribuições de casa. “Neste modelo, o professor precisa ter clareza sobre os objetivos que pretende alcançar com as aulas remotas e presenciais”, aponta.
Na prática
Na fase do planejamento das aulas no modelo invertido, é importante calcular o tempo desse estudo prévio do aluno. Se a indicação for a análise de um vídeo de uma hora para comparar com um texto, por exemplo, o professor deve considerar um tempo adequado para que todos consigam realizar essas tarefas, diz Fernando Trevisani, professor, especialista em metodologias ativas e coorganizador do livro Ensino Híbrido: personalização e tecnologia na educação (Penso, 272 págs., R$ 49). Outro alerta: a quantidade indicada de materiais para o estudo prévio. O caminho recomendado é pela escolha por materiais pontuais que contribuam com a aula presencial de uma forma construtiva e ativa.
Atenção também para o teor dos materiais: nos muito fáceis, a tendência é engajamento baixo; se, ao contrário, forem muito complexos para a turma, a participação pode ser comprometida pelo fato de os alunos não conseguirem compreender e realizar o que foi pedido. A ideia é selecionar itens que contribuam com a aprendizagem dos alunos sem a necessidade de mediação do professor. Vale lembrar que essa lista pode ser composta com materiais de fontes diversas, mas também por recursos usuais, como o livro didático.
A sala de aula invertida pede um cuidado extra com a comanda - isto é, as orientações do que deve ser feito pelo aluno. Não adianta apenas indicar “veja este vídeo antes da aula”, mas “veja este vídeo, anotando os pontos-chave sobre determinado assunto e relacionando-o com outro texto x indicado”, por exemplo. “São verbos que indicam ação, que deixam claro que o aluno tem uma produção a fazer para a aula presencial”, explica Trevisani. Aliás, durante a aplicação prática da aula invertida, este é um ponto crucial: o professor precisa utilizar na aula presencial o conhecimento construído pelos alunos previamente, caso contrário os alunos poderão se questionar: “Poxa, eu fiz tudo isso para quê?”
Potencialidades
A autonomia que gera nos alunos e a mediação feita pelo professor do conteúdo faz da sala de aula invertida um modelo que dá cara nova à aula presencial. “Quando você inverte a aula, o momento presencial é ressignificado; a aula fica mais ativa e os alunos se engajam mais na construção do conhecimento porque eles têm com o que contribuir”, afirma Trevisani. “A possibilidade de diálogo em torno dos conceitos aprendidos é maior, antes e depois da aula presencial.”
Enquanto acompanha o desenvolvimento das atividades prévias de estudo, o docente pode conhecer melhor seus alunos por meio de dados gerados por ferramentas e plataformas digitais. Por isso, utilizar recursos que gerem dados que possam ser analisados pelos docentes é sempre uma ótima opção a ser adotada. Os resultados de um questionário, por exemplo, geram gráficos e tabelas que ajudam a ter uma visão geral da classe. E essas informações devem ser usadas pelo professor para construir a aula com a participação dos estudantes. “Importante não colocar o aluno na posição passiva nas aulas – para não desanimarem – e buscar a participação que, de quebra, estimula a autoestima”, analisa Margareth Polido Pires.
Nesse acompanhamento, o professor pode diferenciar os tipos de materiais indicados. Por exemplo: para alguns é possível oferecer um texto e, para outros, um vídeo. “O professor não somente obtém informações sobre o desempenho dos alunos na construção dos conceitos específicos, mas também tem condições de, ao longo do trabalho, perceber qual é a melhor forma de cada aluno aprender. Isso permite que formas de avaliação sejam desenvolvidas durante o processo de aprendizagem e não somente no final”, afirma Trevisani.
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