Planejamento pedagógico

Xi, deu errado! E agora?

Resultados inesperados não são nem devem ser encarados como problemas. Eles podem ser um impulso para ensinar mais e fazem com que alunos e cientistas avancem

Animação de lousa com fotografia do Mpemba colada ao lado, raio-x e ilustrações de penicilina.
Ilustração: Rodrigo Damati/NOVA ESCOLA

No ambiente escolar, as respostas acidentais ou imprevistas também são um ótimo estímulo para aprender mais e ensinar melhor: “Se os estudantes passam por todas as etapas do método científico, é possível ou não chegar ao resultado esperado. E quando o que acontece não é o que estava previsto, isso pode render bons frutos para a turma seguir adiante, pesquisando mais”, avalia Carla Fernanda Ferreira Pires, professora da EM Rio de Janeiro e da EM Presidente Arthur Costa e Silva, na capital fluminense. 

“Alunos aprendem mais quando erram”, avalia Cristian Annunciato, professor de Física da Escola Lourenço Castanho, na capital paulista. Por isso mesmo, ele acha fundamental abrir espaço no planejamento, sempre que possível, também para os experimentos abertos – aqueles com resultados variáveis. 

E não é só na escola que os imprevistos são bem-vindos. Um resultado inesperado em um laboratório pode ser sinônimo de uma boa notícia no universo da ciência, ainda que isso pareça absurdo. Ele pode ser uma importante descoberta científica, com impactos relevantes para a humanidade, ou levantar um questionamento que faça a ciência avançar, indo atrás de respostas. 

A história da pesquisa científica, aliás, é recheada de exemplos assim. Conheça, a seguir, alguns resultados inesperados registrados no último século, que fugiram da linha de pensamento dos cientistas, e acabaram impactando positivamente a humanidade. O tema de cada um deles tem a ver com habilidades previstas na BNCC para o currículo do 6º ao 9º ano.

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1. Efeito Mpemba

Na BNCC: 7º ano – EF07CI02. 9º ano – EF09CI01

O inesperado e o questionamento: Em 1969, o estudante Erasto Mpemba, da Tanzânia, participava de aula de culinária de produção de sorvete, quando ficou intrigado com uma constatação. Depois de preparar uma mistura quente de leite com açúcar, a recomendação era esperar que ela esfriasse um pouco para colocá-la no congelador. Impaciente, Erasto decidiu pôr a forminha ainda quente no freezer. Depois de algum tempo, constatou que o sorvete que fizera havia solidificado antes da receita dos colegas que tinham esperado a mistura esfriar antes de ir para o congelador.

O efeito curioso já havia sido percebido e registrado séculos antes por Aristóteles, e depois, por Francis Bacon e René Descartes. Mas não havia a justificativa para o resultado e elaboração de teoria a respeito. Anos depois da aula de sorvete, Mpemba escreveu um artigo científico sobre o tema em parceria com seu professor de Física. Após muitos estudos nos anos seguintes, em 2017, pesquisadores das universidades Southern Methodist (EUA) acreditaram ter chegado a uma explicação. Mas, em agosto, novamente as justificativas foram colocadas à prova com estudos apresentados por pesquisadores da Simon Fraser University (Canadá).     

O que se sabe até agora é que a explicação para o efeito – que ainda segue com estudo em curso – pode estar relacionada às mudanças ocorridas nas ligações de hidrogênio presentes na água quando aquecida ou resfriada. 

Para trabalhar com os alunos: antes de contar a história da vivência do garoto Mpemba, questione os estudantes sobre o que eles acham que pode acontecer quando levamos algo quente ou morno ao freezer ou congelador e colocar em jogo se o frio é ou não uma propriedade física.


2. Raio X

Na BNCC: 9º ano – EF09CI06 e EF09CI07

A surpresa e a descoberta: Ao trabalhar com tubos de raios catódicos (compostos por elétrons que se originam no interior de tubos cheios de gás rarefeito), o físico alemão Wilhelm Röntgen (1845-1923) percebeu que os tubos iluminavam o ambiente com um feixe de luz de coloração verde. Quando colocou a mão em frente a ela, pôde ver a imagem dos próprios ossos. Já a partir do ano dessa descoberta, em 1895, a tecnologia, batizada de raio X (o raio Röntgen), foi aprimorada com chapas fotográficas e usada em hospitais.

Mais adiante, o físico francês Antoine Henri Becquerel (1852-1908) passou a estudar a fosforescência do raio X. Em experimento feito com placas, ele observou a interação da luz nos sais de urânio presentes, o que, mais tarde, foi confirmado serem efeitos da radioatividade – termo cunhado pela cientista polonesa Marie Curie (1867-1934), que, juntamente com seu marido, o francês Pierre Curie (1859-1906), dividiu o Prêmio Nobel de Física de 1903 com Becquerel, pela descoberta.

Para trabalhar com os alunos: Você pode discutir com a turma como é importante que, em ciência, não se desprezem novidades que aparecem no decorrer de uma experiência e apresentar a história do raio X. Pode também usar o fato para discutir o papel da radiação na medicina.


3. Penicilina

Na BNCC: 6º ano: EF06CI04. 7º ano: EF07CI11

O desvio e a invenção: Em 1928, o médico escocês Alexander Fleming (1881-1955) estava debruçado em seus estudos em bacteriologia, quando notou o crescimento de um fungo nas amostras com cepas de Staphylococcus (grupo de bactérias da flora residente no corpo humano). Diferentemente de outras amostras onde as bactérias se desenvolviam normalmente, as contaminadas com o fungo morreram. Fleming identificou a linhagem do fungo, chamando-o de Penicillium chrysogenum.

A manipulação desse fungo gerou a penicilina que, testada em humanos a partir de 1940, abriu espaço para a era dos antibióticos – remédios de baixo custo que se tornaram imprescindíveis no combate de doenças, tais como sífilis, gangrena gasosa, meningite bacteriana, endocardites bacterianas, amigdalites, faringites e epiglotites, entre outras.

Para trabalhar com os alunos: Apresente a história da descoberta da penicilina para a classe e explore como algo que aparentemente “deu errado” não deve ser descartado.

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