Para usar com os alunos

Vamos escrever um diário compartilhado?

Confira uma proposta para estimular a meninada a pensar nos sentimentos e no cotidiano e escrever sobre tudo isso

Ilustração a partir de colagens de aluna escrevendo um diário.
Ilustração: Rafaela Pascotto/NOVA ESCOLA

Dentre os gêneros confessionais, o diário é o mais simples de descrever: trata-se de um registro sistemático e reflexivo do próprio cotidiano. Por isso, a escrita confessional com esse gênero pode ser trabalhada ao longo de todos os anos do Ensino Fundamental e se converter em uma fonte rica de elaboração de sentimentos e do autoconhecimento.  

Mas como, se a confidencialidade é a principal marca do diário? 

“Para trabalhar a escrita de diário na escola, uma das estratégias que valem a pena é fazer uma mudança para garantir que todos tenham a experiência: propor o compartilhamento”, afirma Manuela Prado, professora de Língua Portuguesa do Colégio Santa Cruz e selecionadora do Prêmio Educador Nota 10. Talvez a experiência acarrete certa perda da espontaneidade e da função mais profunda de autorreflexão. Mas um dos bônus da proposta é o olhar para o outro. 

Sem tirar a função primeira do diário de ser algo privado, existem formas de ação para que o compartilhamento seja da experiência e não do conteúdo. Neste caso, a espontaneidade da elaboração é preservada, já que o aluno se sentirá à vontade para ser sincero consigo mesmo, sem o medo do julgamento. “O cuidado com a privacidade é fundamental por se tratar de um trabalho com o gênero confessional que tem objetivos relacionados às habilidades e não apenas do estudo da linguagem”, reforça Maria Alice Junqueira, coordenadora de projetos de alfabetização do Cenpec Educação. O professor pode estimular o compartilhamento da experiência de escrita – não do conteúdo. “O diário, além do exercício de produção de texto, é um exercício de reflexão e de autoconhecimento.”

É possível discutir em sala como os alunos estão sentindo o momento atual, estimulá-los a escreverem por alguns dias suas impressões cotidianas. Assim, a escrita mantém-se como exercício privado de elaboração para que, na hora da discussão sobre o momento ou o fato vivido, o estudante chegue com as reflexões mais maturadas sobre si mesmo. Os diários podem, ainda, ser uma forma de o professor conhecer cada um da turma. "Há experiências em que as crianças querem compartilhar a escrita com o professor, o que pode ser muito rico para ele conhecer a realidade dos estudantes", conta Maria Alice. Por isso, mesmo que a atividade não contemple a entrega do que foi escrito, é importante mostrar-se aberto para receber as produções dos alunos, caso eles assim desejem.

Para fazer com que a atividade, além de estimular a escrita e a reflexão, contribua para a criatividade, é possível propor que os estudantes relatem o cotidiano de uma personagem de ficção de um livro trabalhado nas aulas. A sugestão de Mazé Nóbrega, assessora pedagógica e consultora em metodologia de Língua Portuguesa de NOVA ESCOLA, é especialmente interessante para o 6º e o 7º ano. A partir dessa experiência é possível passar para o diário propriamente dito, mas aí o que será compartilhado será a experiência de escrever – não o conteúdo. “Combine com a turma que cada um vai escrever o próprio diário durante quinze dias. Depois, organize uma roda de conversa para que os estudantes contem como foi escrever, como se sentiram escrevendo, quem vai continuar com o diário”, orienta Mazé. 

Nova Escola Box conversou com o professor Rafael Palomino, professor de Língua Portuguesa e selecionador do Prêmio Educador Nota 10, sobre como encaminhar a proposta.

divisória de atividade

ATIVIDADE: Escrita de diário durante a pandemia

Convide os alunos a pensar no dia a dia e a olhar para si mesmos e registrar os momentos em papel ou no formato digital


Indicado para: 6º ao 9º ano

Na BNCC: Competências gerais 8 e 9 e Habilidades específicas de Língua Portuguesa EF69LP46, EF69LP49, EF67LP30 e EF89LP33.


PASSO A PASSO

1. Vamos conversar? Antes de apresentar a proposta para a turma, pergunte sobre como tem sido a rotina de cada um com o ensino remoto. Os alunos podem ter dificuldade para se abrir, ainda mais em encontros síncronos, mas uma boa questão disparadora é a própria Educação: como estão fazendo para acompanhar as aulas? Sempre alguém toca nas dificuldades e isso dá a chance de perguntar por que, ampliando assim a conversa para falar sobre as dificuldades do ensino remoto e da própria pandemia. Com o passar do tempo, os alunos vão se abrindo e o tema sendo legitimado.

2. Vamos escrever? Proponha que cada um faça um diário da pandemia. Explique que a intenção não é fazer um diário íntimo, daqueles que ninguém pode ler, mas sim, algo semelhante a um diário de viagem ou diário de bordo. Sugira que os alunos escrevam como se estivessem conversando com seu eu do futuro pós-pandemia, dizendo a ele o que gostariam que ele se lembrasse. Destaque que o objetivo do diário é fazer um registro de impressões pessoais sobre um momento que é muito excepcional, e do qual talvez gostássemos de guardar registros, para rever no futuro, quando tudo tiver passado. Não se trata, portanto, de descrever a rotina, mas de, a partir dela, refletir sobre sua condição na pandemia, que pode ser a de isolado ou de pessoa privada do direito de se isolar. Explique para a garotada que é importante organizar um produto: um diário feito à mão, customizado como cada um quiser, ou um diário digital, compartilhável ou não, no formato de blog. O importante é ser algo ao qual eles possam atribuir valor afetivo.

Ponto de atenção: Oriente os alunos para que deem atenção a temas relevantes: é importante falar sobre o dia, mas estimule-os a superarem o simples relato, investigando um pouco o que, no dia, pareceu importante e por qual motivo. Para tal, proponha questões disparadoras, como: “O que chamou atenção na imprensa, no YouTube, na Netflix, e por quê?”

6. Vamos compartilhar? Crie uma rotina de compartilhamento das reflexões. O diário pode durar um mês, por exemplo, e haver quatro momentos, em aula, nos quais alguns alunos lerão os registros que quiserem dividir com os colegas sobre sua semana.

Ponto de atenção: Ninguém precisa compartilhar todo o conteúdo, é possível que os alunos escolham trechos para ler para os colegas. 

7. Vamos dialogar? A partir dos relatos, proponha a discussão, que pode ser durante uma aula síncrona. Para aquecer a conversa, pergunte se a turma identifica pontos em comum da rotina de cada um e o que chamou atenção dos alunos em determinado relato.


Outras propostas de escrita

Conforme sugere Rafael Palomino, professor de Língua Portuguesa e selecionador do Prêmio Educador Nota 10, é válido propor que os alunos investiguem o passado da família, conversando com os mais velhos, para escrever uma autobiografia ou as memórias da família, por exemplo. Ou escrever relatos de experiências e memórias cujo compartilhamento na classe sirva para o estudante se apresentar e refletir sobre questões relevantes para o grupo. 

“O compartilhamento é um momento importante, ajuda os alunos a se fazerem conhecer pela turma, e a turma a se aproximar mais, construir vínculos”, reflete Rafael.

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