10 contos e fábulas para falar do eu e do outro no Fundamental 1
Confira a lista de histórias que ajudam a conversar com a turma sobre como lidar com as próprias emoções, com as relações interpessoais e com as adversidades no meio de uma pandemia
Retorno às aulas presenciais. Criançada eufórica e um monte de protocolos para seguir. A professora de Língua Portuguesa e pedagoga Regina Alfaia, da Escola Stance Dual, em São Paulo, decidiu, então, apresentar um conto sobre a importância das ações que são individuais, mas que protegem também o outro. A ideia era problematizar com as crianças o protocolo número 1 da pandemia: o uso de máscaras. Regina achou que seria uma discussão inicial, feita uma única vez, mas o constante questionamento do uso das máscaras pelos próprios adultos fez com que ela promovesse as rodas de discussão de quando em quando com a turma.
Foi então que a professora decidiu tornar um ponto fixo em seus planos de aula: discutir fábulas e contos que de alguma maneira possam provocar discussões sobre persistir na adversidade ou fazer escolhas cujos resultados virão a longo prazo; sobre a prudência diante da ameaça sanitária e mesmo sobre enfrentar os desconfortos para agir com correção e justiça, como possibilidade de escuta e aprendizado.
“Analisar e compreender a linguagem metafórica das fábulas, discutir e argumentar sobre os pontos de vista possíveis é um contexto muito importante de uso da língua para crianças”, afirma Regina. Ela chama atenção para o fato de as fábulas serem textos que promovem conteúdos morais, mas não descartam a possibilidade de uma leitura crítica. “Mesmo expressando valores universais, as fábulas são passíveis de novas interpretações e de questionamentos que podem surgir durante as discussões”, comenta a professora. “Portanto, não se pode indicar como panaceia ou mesmo com uma única finalidade”, completa.
A seguir, NOVA ESCOLA apresenta uma seleção de contos e fábulas que permitem iniciar conversas sobre sentimentos, relações interpessoais e as adversidades do contexto pandêmico. Os comentários são da professora Regina.
FÁBULAS
O leão e o mosquito, do livro Fábulas de Esopo
História sobre um mosquito, um leão e uma aranha, as dificuldades que cada um impõe ao outro para ser capturado, e sobre qual dos três é o mais temível. Ou, o menor de nossos inimigos pode ser o mais temível.
“Isso pra mim tem tudo a ver com o dilema que a gente tá vivendo, porque tem um monte de confusão em torno da pandemia. Às vezes, o maior perigo vem de onde você menos espera.”
O urso e as abelhas, do livro Fábulas de Esopo
Um urso necessita de mel para se alimentar, mas para isso precisa suportar em silêncio as picadas das abelhas, e assim levar o seu prêmio sem se ferir completamente.
“Essa fábula é sobre ser mais importante suportar um só ferimento em silêncio do que perder o controle e acabar todo machucado. Faz muito sentido para alguns dilemas das crianças.”
As lebres, a raposa e as águias, do livro Fábulas de Esopo
Uma lebre, uma raposa e uma águia aparecem conversando, negociando e formando alianças. A lebre, no entanto, está em clara desvantagem, sendo passada para trás pela raposa e pelas águias.
“Só é possível formar uma sociedade quando os dois parceiros estão unidos em torno de uma mesma causa. Todos têm de adotar as mesmas defesas, então, não adianta escolher amigos inadequados.”
A águia e a seta, do livro Fábulas de Esopo
Uma águia sai para caçar, mas não percebe em seu território um caçador escondido, que a fere com uma flecha. Ela nota, então, que na ponta da flecha há penas de águia, e isso é o que mais a entristece.
"As desgraças para as quais nós mesmos contribuímos são duplamente amargas. Isso tem tudo a ver com a pandemia.”
Os meninos e as rãs, do livro Fábulas de Esopo
Meninos brincam à beira de um lago jogando pedras na água. Enquanto riem da brincadeira, as rãs que vivem no lago são atingidas. Uma rã levanta-se e diz aos garotos: “Ei, vocês não estão vendo que com essa brincadeira estão nos matando?”
“Nossos prazeres não devem prejudicar os outros. Essa fábula me faz pensar nas pessoas que vão às festas, às aglomerações, sem se preocuparem que isso pode levar à morte de outras pessoas.”
CONTOS
O rei que tinha orelhas de burro, do livro Lendas e Fábulas do Brasil, de Ruth Guimarães, Editora Cultrix
Apenas o barbeiro sabia que o rei tinha orelhas de abano. Era um grande segredo entre os dois, guardado a sete chaves. O barbeiro morre e é substituído por um mais jovem, que sofre ao saber que teria de guardar um segredo tão importante do rei.
“Conto que apresentei assim que as crianças se queixaram de como sentiam falta de ter um amigo para contar segredos. Elas perderam aquela conversinha no pátio da escola, na hora do recreio, onde ficam longe dos olhares dos adultos, e isso faz muita falta.”
O pássaro de fogo, do livro O Pássaro de Fogo e Outros Contos de Fadas Russos, de Paulo Rezzutti e Adriana Moura, Editora Leya
O que não falta aos heróis desse livro são missões impossíveis. São seis contos em versão integral, numa linguagem acessível às crianças, com dezenas de ilustrações do premiado desenhista Nicolai Troshinsky. São histórias repletas de seres fantásticos, de princesas e dragões, de truques mágicos, mas, sobretudo, de muito humor e aventura.
“Esse conto é perfeito para falar de coragem, medo e persistência.”
A galinha foi passear lá na montanha, do livro Por Que o Mar É Salgado - Contos populares da Noruega, de Asbjornsen e Moe, Editora Berlendis e Vertecchia
Asbjornsen e Moe foram dois amigos que se dedicaram a pesquisar o folclore de seu país, a Noruega. Inspirados nos irmãos Grimm, publicaram, ao longo de décadas, uma verdadeira enciclopédia da narrativa oral escandinava. Entre trolls, camponeses e corajosos heróis, podemos reviver esse mundo tão fantástico e, ao mesmo tempo, tão humano.
“Conto de coragem, solidão e isolamento, como escolha e sacrifício; conta também como uma personagem pequena e frágil pode ser ardilosa e perseverante diante de um perigo terrificante.”
Hachikazuki - A menina com um vaso na cabeça, do livro Histórias Tecidas em Seda, de Lúcia Hiratsuka, Editora Cortez
Com impressionante delicadeza, Lúcia Hiratsuka traduz em texto e imagem contos japoneses que povoaram sua infância. As histórias, portadoras de valores preciosos como o respeito, a perseverança e a confiança nas próprias capacidades, são um importante registro da riqueza da diversidade cultural, também constituinte do Brasil, e permitem ao leitor ampliar seu conhecimento e valorizar a diversidade e as tradições de outra parte do mundo.
“Uma lindeza esse conto que não pude deixar de relacionar com o uso de máscaras e os sacrifícios exigidos durante a pandemia, mas que também reforçou o aspecto do gesto amoroso que é usar algo que protege a si e ao outro.”
O moço encantado pelo corpo-sem-alma, do livro Contos de Espanto e Alumbramento, de Ricardo Azevedo, Editora Scipione
O livro apresenta nove versões de contos populares em que o diálogo entre o "maravilhoso" e a "vida concreta" tende às instâncias desta última. Neles, o leitor certamente encontrará heróis enfeitiçados, animais mágicos, monstrengos e encantamentos, mas notará que os temas da transgressão, da inveja, do amor – assuntos da vida concreta – são preponderantes e estão delineados com grande nitidez.
“Uma história recheada de cooperação, reciprocidade, generosidade e ousadia que Ricardo Azevedo tão lindamente nos conta em seu livro Contos de Espanto e Alumbramento. Devo dizer que recomendo o Azevedo para qualquer momento e para atravessar qualquer isolamento ou catástrofe em companhia afortunada.”
PONTO DE ATENÇÃO: Nem sempre a moral da história é óbvia para os alunos – e mesmo para os adultos. Isso depende de como cada um está se sentindo naquele momento. É possível se identificar mais com um ou outro personagem, ou mesmo não se ater a um ponto específico do texto. Por isso as rodas de conversa depois de contar as histórias são tão importantes. É ali que a turma vai problematizar, a partir da fala do outro, o contexto envolvido.
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