Na prática

Saúde Mental, ensino híbrido e evasão: 3 pontos para cuidar na transição para o presencial

Será o momento de diagnosticar e enfrentar questões socioemocionais, da evasão escolar à saúde mental de estudantes e professores

Ilustração digital simulando pintura manual de pessoas carregando formas geométricas abstratas.
Ilustração: Julia Coppa/NOVA ESCOLA

A transição do ensino remoto para o híbrido ou presencial esperada para o segundo semestre traz desafios que extrapolam as questões sanitárias e pedagógicas. Será o momento também de diagnosticar e enfrentar questões socioemocionais, da evasão escolar à saúde mental de estudantes e professores.  

“Professores e alunos passarão por uma readaptação do convívio social”, destaca Renata Capovilla, cofundadora da Íntegra Educacional. 

Para o professor, alguns desafios devem ser considerados: como está o emocional e a compreensão do mundo dos estudantes? Como foi o desenvolvimento real que alcançaram, tendo em vista que há compreensões essenciais para a continuidade do ano letivo? Como sanar as lacunas pedagógicas? Como seguir com o planejamento até o fim do ano, considerando essas questões anteriores?

Para Renata, é importante que as escolas planejem um tempo de reconhecimento dos alunos com seus professores, pois será preciso tempo para desenvolver dinâmicas que poderão gerar um vínculo diferente do já criado remotamente e estabelecer um novo ritmo de aprendizado. 

É importante também haver um período de avaliação diagnóstica para que os professores saibam em que ponto cada estudante está em seu desenvolvimento e tenham segurança de onde devem partir ou como planejar a continuidade do semestre. “Para isso, podem estabelecer cronogramas diferenciados e personalizados para grupos de estudantes ou até individuais, pois, possivelmente, as lacunas serão diferentes para cada um”, sugere.

De olho na saúde mental e emocional, é fundamental acolher o aluno, o que vai além de ter um primeiro dia de volta às aulas mais tranquilo, seguido de dias de corrida contra o tempo no desenvolvimento dos estudantes. 

“É preciso se aproximar desses estudantes para poder compreender se estão emocionalmente preparados para um retorno presencial, para auxiliá-los nas dificuldades pedagógicas e emocionais, de forma a retomar o aprendizado e o ritmo das aulas com cautela”, resume Renata. Além disso, a educadora sugere que os professores planejem aulas nas quais o aluno protagonize seu aprendizado e tenha confiança de dizer ao professor quais são suas dificuldades, sejam elas pedagógicas, sejam emocionais. 

E, claro, não são só os alunos que precisam de cuidado na adoção de um novo modelo de ensino. “Amparar o professor dependerá muito da cobrança que a escola exercerá sobre ele neste momento”, afirma Renata. 

O professor precisa ter tranquilidade e amparo da gestão para entender que não precisa, nem deve, sanar todas as lacunas de um ano e meio de inseguranças com a pandemia em seis meses de aula. “Ele deve, sim, priorizar o que precisa ser priorizado”, reforça.

Para Joice Lamb, coordenadora pedagógica da EMEF Prof. Adolfina J.M. Diefenthäler, em Novo Hamburgo (RS), especialista em gestão escolar pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e consultora de NOVA ESCOLA para os conteúdos desta edição, o acolhimento dos professores é uma função importantíssima da gestão. 

“Os professores que não estão seguros e tranquilos não vão conseguir executar plano nenhum”, reflete. É preciso ter momentos de escuta para os professores e entender quais são os dramas que eles estão passando, quais os medos no retorno e as angústias de não conseguirem alcançar seus alunos. “Eles não podem se sentir sozinhos, como se a gestão da escola fosse só demandar tarefas sem se importar se essas tarefas são possíveis”, ressalta Joice. “A gestão tem de fazer reuniões frequentes com os professores para que eles possam dizer suas incapacidades e seja criada uma estratégia de enfrentamento desses problemas coletivamente”, sugere a educadora.

Para além das questões de acolhimento, Joice elencou mais três desafios para serem observados no retorno às aulas e deu dicas de como enfrentá-los. 

Saúde mental dos estudantes: os professores não sabem por quais dores e tristezas os alunos passaram ao longo do período fora da escola, então não basta chegar na sala de aula e querer ensinar o conteúdo como se apenas isso fosse importante. É preciso que o aluno esteja interessado em aprender e ele não estará interessado se não puder dividir com o professor que está triste porque perdeu um ente querido, por exemplo. É preciso uma escuta tranquila nas primeiras aulas para se formar novamente o vínculo com os alunos. Desta forma, os alunos terão mais tranquilidade para aprender e mais confiança no seu professor. O aluno precisa confiar que o professor está cuidando dele também. 

Ensino híbrido: é preciso ter uma metodologia alinhada na escola, com objetivos, propostas discutidas com base na experiência até aqui do que funciona ou não. A escola deve compreender a realidade dos alunos para que todos sejam alcançados da mesma forma, inclusive aqueles que por alguma razão permanecerem totalmente no ensino remoto. 

Evasão: o longo período de ensino remoto esgarçou o vínculo dos estudantes com a escola. Isto, somado às inúmeras vulnerabilidades sociais a que muitos alunos estão sujeitos, leva ao abandono dos estudos. O primeiro passo é uma ação rápida da escola ao primeiro sinal de evasão se acionar os mecanismos de busca ativa. A partir deles, será possível compreender, de maneira individualizada, as razões daquele abandono e criar estratégias para trazer o aluno de volta. “Só é possível impedir que as crianças e adolescentes deixem a escola com muita sensibilidade e controle”, resume Joice.

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