Para repensar a escola

Transição para o Fundamental 2: quais são os grandes desafios na pandemia?

Ensino remoto e distanciamento social da escola agravam dificuldades na passagem do 5º para o 6º ano

Ensino a distância deixa ainda mais complexo o processo de transição para o Fundamental 2. Foto: Tainá Frota/Nova Escola

Há cinco meses, a maior parte das escolas suspendeu as aulas presenciais por conta da pandemia de covid-19. Com isso, novos desafios somaram-se a outros velhos gargalos da Educação brasileira. Um deles é o processo de transição dos anos iniciais para os finais do Ensino Fundamental, que se tornou ainda mais complexo diante do ensino remoto, em especial para os professores responsáveis pelas turmas de 5º ano. 

É importante lembrar que a transição do 5º para o 6º ano já é, por si só, um grande desafio para os envolvidos, ressalta a pesquisadora Renata Borges. “Os alunos dessa faixa etária estão vivendo inúmeras mudanças pessoais (físicas, emocionais e psicológicas), pois estão indo para a adolescência. No contexto atual, essas dificuldades triplicam porque o aluno precisa desse ‘desmame’ do professor polivalente, e isso acontece no decorrer do 5º ano”, explica Renata, que é mestre em Educação e doutoranda no programa de Psicologia da Educação pela PUC-SP. 

Para a especialista, que tem um estudo sobre o assunto e é diretora da EE Izac Silvério, na Zona Norte de São Paulo (SP), o ensino remoto dificulta esse processo. “Para que a transição aconteça com menos sofrimento, precisa ter vínculo afetivo, abraço, despedida, acolhimento, receptividade, pontos que o ensino remoto não favorece. A transição vai ficar extremamente comprometida com o ensino remoto. Sem o contato físico não dá pra estabelecer vínculo, e sem vínculo isso não acontece”, defende a pesquisadora. 

Em Paulínia (SP), a professora do 5º ano na EM Profª Odete Emídio de Souza, Andressa Lélis, conta que o maior desafio é acessar as devolutivas dos alunos que irão para o Fundamental 2 em 2021. “As atividades da rede inteira são postadas semanalmente no Drive encontrado no site da prefeitura. Mesmo assim, nem todos tem acesso à internet, o que faz com que as escolas imprimam o material para quem precisar. A maior dificuldade é obter o feedback de muitos alunos que irão para o 6º ano em 2021”, relata Andressa. 

Outro ponto de dificuldade é o próprio distanciamento dos alunos da escola e dos professores. Dionizio Pereira Neto, professor do 5º ano na EMEF Maria do Socorro Gouveia, em São Gonçalo do Amarante (CE), conta que apesar dos esforços de toda a equipe, a transição não ocorrerá de forma plena, principalmente  pela falta de contato com os alunos. “Há casos, por diversos motivos, em que a família e o aluno não puderam fazer parte do ensino remoto”, diz o educador, que não tem medido esforços para motivar e demonstrar afeto para aqueles que conseguem participar das videoaulas.

Para Renata, o maior desafio deste momento é manter o vínculo afetivo com os alunos. “A afetividade é primordial para o processo de aprendizagem, que só acontece quando existe um vínculo afetivo. Mal tivemos tempo de nos aproximar dos alunos e logo as aulas logo pararam”, diz. A falta de acesso também prejudica essa proximidade entre professor e aluno. “Antes a gente sabia que o aluno tinha celular para tirar foto, mas muitos não têm acesso à internet e não sabem mexer nas ferramentas”, observa. 

Lys Vinhaes, doutora em Educação e pesquisadora na Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB), comenta que, além das transformações pessoais, os alunos podem se deparar com uma possível mudança de escola, que vai demandar conhecimento do ambiente e das novas regras para que os alunos se sintam novamente em casa. Além disso, a pluridocência também pode trazer estranhamento. Afinal, são professores diferentes a cada dia e disciplina. 

A pesquisadora atuou em um projeto sobre transição e acredita que, em resposta à pandemia, um cenário diferente foi criado e enfrentamentos deixaram de ser feitos, como o do espaço escolar, transporte e convivência com outros adolescentes. Mas, em contrapartida, segundo ela, outros foram realçados, como a demanda por autonomia de aprendizagem e a necessidade de lidar com vários docentes, a distância, no caso dos alunos que já estão no 6º em 2020.

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