Como uma escola usou blog e Padlet para estreitar laços afetivos entre os alunos
Na EMEB Aldino Pinotti, em São Bernardo do Campo, a coordenadora Jéssica criou, com os professores, diferentes estratégias para documentar atividades pedagógicas em ferramentas digitais
Como é possível manter a proximidade, o carinho e o apoio aos alunos em uma situação de distanciamento físico total? Na EMEB Aldino Pinotti, em São Bernardo do Campo (SP), a coordenadora pedagógica Jéssica Maria de Campos Matsumoto transformou o registro das atividades pedagógicas, exigido como comprovação do trabalho, em memória e identidade de todo o corpo escolar nestes tempos de pandemia. O resultado foi professores e alunos apreciando as suas práticas e as dos colegas, aprendendo a aprender com o outro e alimentando, assim, a relação afetiva do grupo.
Quando a pandemia bateu, em meados de março, a escola ainda estava na etapa de acolhimento dos alunos, típica de início do ano letivo. Também estava em curso a formação pedagógica dos professores, cujo foco seria um estudo sobre a documentação pedagógica (isto é, os registros e produções dos alunos) a partir das ideias do educador italiano Loris Malaguzzi (1920-1994) e do brasileiro Paulo Fochi. “Mas aí a escola teve de fechar. Aquele papo com as famílias no portão não era mais possível. Nós nos sentimos, de início, perdidos e inseguros”, conta a coordenadora.
Blog e bate-papo da Pinotti
Mas a resposta para o desafio de continuar o trabalho, mesmo de portas fechadas, estava bem ali: o PINOTTÍCIAS, blog da escola que há três anos é usado pela coordenação para divulgar ações comunitárias, como campanhas de vacinação, e eventos culturais, se transformou em ponto de encontro. Sem os bilhetinhos e o papo de portão, a página se transformou no grande veículo de interação com as famílias. “Com o tempo, percebemos que as famílias estavam deixando recados, abrindo um diálogo. Começaram a chegar relatos das crianças, e nós passamos a incentivar o envio de vídeos, áudios e fotos das famílias”, conta Jéssica.
Pouco a pouco, mais e mais relatos chegavam e, passados dois meses, o xis da questão era outro: e os alunos que não estavam mandando notícias? “Não sabíamos para onde ir e como retomar o vínculo. Os alunos são muito carentes de escuta, ávidos por contar as novidades, e nós queríamos ouvi-los”, conta Jéssica.
A equipe partiu, então, para a busca ativa, telefonando para todas as famílias. A ideia, segundo a coordenadora, foi fazer uma escuta aberta, deixando adultos e crianças livres para desabafar. Foi aí que os professores entenderam que era preciso montar grupos de WhatsApp com toda a turma - os quais serviam para passar as atividades pedagógicas, é claro, mas teriam como focos o bate-papo e a recuperação do vínculo.
Diário de Bordo (invertido)
O passo seguinte foi radicalizar e potencializar a proposta de formação do ano, que havia ficado pelo caminho, falando sobre memória. A frase norteadora da formação é: o que não é visto não existe. Aquele registro das atividades pedagógicas, que no início era reunido “para a coordenadora ler”, transformou-se em memória, reflexão e identidade. “Esses conceitos não são novidade, mas, no dia a dia, o sentido deles fica lá no fundo do baú. O que fizemos, com a pandemia, foi transformar isso em prática, como uma forma de estar mais próximos dos alunos”, explica a pedagoga.
Primeiro, Jéssica montou uma sala de aula on-line, onde disponibilizou textos (importante dizer: na íntegra) para o estudo das professoras sobre o tema. Para a coordenadora, esse estudo aprofundado foi crucial. Depois, abriu-se espaço para discussão dessas leituras (nesta Caixa, você encontra uma lista de livros que a coordenadora usou).
Memória do grupo do WhatsApp
A formação levou os professores a buscarem formas de registro diversas. Cada relato das atividades feitas em casa pelos alunos, fossem relacionadas ao aprendizado ou não, virou uma memória. Houve turmas, por exemplo, que produziram um jornal em arquivo PDF, com fotos e frases dos alunos em pequenas reportagens sobre os trabalhos realizados pelas crianças.
Nesses, os alunos escolhiam o nome que seria dado ao jornal e ajudavam na “apuração”, detalhando o processo das atividades e dando entrevistas sobre o que acharam das atividades, como foi realizá-las etc. “Uma das professoras descobriu o Padlet e fez o curso sobre a ferramenta com NOVA ESCOLA. Em um momento de planejamento, ela compartilhou a ideia com a equipe e várias colegas produziram murais para compartilhar as participações das crianças e suas famílias, permitindo que a memória do grupo fosse revisitada por quem tivesse acesso”, conta Jéssica.
Nesses murais, rolaram registros de cenas do cotidiano, mostras de obras artísticas e outros itens. E o espaço fica aberto para comentários e trocas - inclusive de amigos e outras pessoas da família, como os avós, que, segundo as professoras, andam muito ativos por lá.
Cada docente teve autonomia para pensar em como documentar as atividades da sua própria turma. “Falamos muito do aluno como protagonista do seu aprendizado. Mas se o professor não tiver isso como sua própria experiência, ele não vai incorporar isso no trabalho com as crianças”, reflete Jéssica.
Uma vez prontos, os jornais, folhetos e murais são compartilhados com toda a turma. As professoras relatam que tanto as crianças quanto as famílias, assim que veem suas atividades valorizadas, passam a se engajar mais e a sugerir temas para as próximas aulas.
Para a volta das aulas presenciais, esses registros em formato digital serão usados como documentos, como a memória do grupo dessa fase, e a identidade deles como alunos e colegas. As crianças são miúdas só na altura: o coração é grande e alimenta um interesse genuíno pelo outro.
Mais sobre esse tema