Projeto leva ensino de Matemática para oficinas de costura
Em uma cidade onde há 1.487 indústrias têxteis, Jussara Schmitz resolveu aproximar a aula da realidade que as crianças tinham em casa
Jussara Schmitz sempre envia para os pais de seus alunos do 4º ano da EEB Frei Godofredo, em Gaspar (SC), um questionário para conhecer mais os alunos e suas famílias. Em 2018, mais da metade destes questionários voltaram com uma coisa em comum: 60% das famílias das crianças dependiam da costura para o sustento da casa. Não é de espantar, já que a cidade de Gaspar, que fica no Vale do Itajaí, tem 1.487 empreendimentos na área têxtil, incluindo as grandes indústrias, as facções (como as oficinas de costura são chamadas na região) e outros pequenos negócios. A própria Jussara é filha de costureira. “Eles mesmos [os alunos] perceberam. ‘Costureira de novo, né, professora?’, eles comentavam, enquanto íamos anotando as respostas dos questionários”, conta Jussara.
Foi naquele momento que Jussara teve a ideia de criar o projeto Costurando a Matemática, que foi um dos dez vencedores do Prêmio Educador Nota 10 deste ano. No projeto, Jussara levou suas duas turmas de 4º ano para as oficinas de costura, onde elas entrevistaram as costureiras para coletar dados sobre produção diária, horas de trabalho e valor das peças. A ideia era partir desses números para construir conhecimento matemático em sala de aula. Foram quase seis meses de trabalho e visitas a cinco facções diferentes. “Eles já iam com as perguntas prontas. Chegavam na facção e conheciam todo o ambiente, anotavam as respostas das costureiras e depois nós trazíamos para a sala”, lembra Jussara.
De volta à escola, eles transformavam tudo o que tinham anotado em situações-problema de Matemática: comparando a produção entre uma e outra facção, calculando quanto uma costureira tinha de produzir para ganhar certo valor, construindo gráficos com o que apuraram. “Nós realmente dialogávamos. Anotamos esses dados juntos, para eles responderem também juntos. Íamos tabulando os dados e eu ia criando esses problemas, fazendo com que eles pensassem sobre toda essa dinâmica das costureiras”, diz a docente. “Esse era o meu objetivo, que eles vissem uma Matemática real, viva. Era gostoso ouvi-los dizendo ‘foi minha avó quem fez tantas peças’. Nós fazíamos umas estimativas: por semana, quanto ela vai conseguir fazer se conseguir manter essa produção diária por cinco dias?”.
Jussara conta que a diferença observada nas crianças foi o entusiasmo, a empolgação com a aprendizagem. “Quando se valoriza aquilo que é próprio deles, que é da vivência deles, é nítida a vontade de fazer as coisas, o zelo pelas atividades. O projeto se importou com a questão social, com o trabalho das famílias deles.” A professora lembra que mesmo os alunos que apresentavam mais dificuldade com a disciplina apresentaram uma melhora de rendimento depois do projeto. “Todos [os alunos] estão juntos no mesmo processo, na mesma discussão. Isso auxilia muito a criança que tem dificuldade, ela se sente mais encorajada”, explica.
Projeto ponto a ponto
1. Jussara envia um questionário para os pais para saber mais sobre a realidade dos alunos. Com as respostas em mãos e juntamente com os alunos, ela levanta quais as profissões mais comuns entre as famílias.
2. A professora fez a proposta de visita às oficinas de costura aos alunos, anotou sugestões, fez a lista dos locais a serem visitados, e com os alunos elaborou as perguntas para as costureiras.
3. Jussara visitou os locais de visitação já definidos para combinar como seria a conversa com as costureiras. Com a ajuda de um funcionário da escola, as crianças e a professora fazem as visitas.
4. De volta à sala de aula, alunos e professora analisam os dados coletados e, a partir de tais dados, são elaborados problemas matemáticos para as crianças resolverem.
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