História do Brasil

Do fim do tráfico negreiro à Lei Áurea: conheça a cronologia da abolição da escravidão no Brasil

Entenda como abordar o 13 de maio nas aulas de História do Fundamental 2 de maneira contextualizada e em sintonia com uma educação antirracista

Para entender a dimensão e a complexidade do 13 de maio de 1888, é preciso voltar no tempo, ampliar o escopo de referências e aguçar o olhar e o pensamento crítico.

Foi a Lei Áurea, assinada pela Princesa Isabel Cristina Leopoldina Augusta Micaela Gabriela Rafaela Gonzaga de Bourbon-Duas Sicílias e Bragança em 1888 que colocou um ponto final em toda a história da escravização de homens, mulheres e crianças no Brasil? A resposta é complexa e exige ainda mais a atenção e o cuidado dos educadores caso deseje abordá-la. 

Para entender exatamente a dimensão do 13 de maio de 1888, é preciso voltar um bocado a mais no tempo, ampliar o escopo de referências e aguçar o olhar e o pensamento crítico. Afinal, compreender e ensinar a data de forma contextualizada é fundamental para conhecer a história da segunda metade do século 19,  o racismo estrutural e outras consequências que marcam até hoje a sociedade brasileira.  

“Marcar a abolição como o 13 de maio tira um pouco a história das populações negras, dá a impressão de que não houve resistência. A Lei Áurea foi o ponto final de um processo que começou muito antes”, sinaliza o historiador e professor da rede pública, que também faz parte do Time de Autores NOVA ESCOLA, Jair Ferreira. 

A sugestão do professor para as aulas de História do Fundamental 2 é trabalhar com os alunos trechos do texto das leis - como a Áurea, dos Sexagenários, Ventre Livre, por exemplo - para que se possa compreender a diferença do que estava no papel e do que se deu na prática. As íntegras destas leis estão disponíveis no site do Palácio do Planalto

“Foque no movimento social e não na lei em si. A lei é somente o desfecho. O que acabou mesmo com a escravidão foram duas coisas: o movimento social interno e a pressão internacional, já que o Brasil foi um dos últimos países a abolirem a escravidão”, reforça. Isto é, o processo aqui, diferentemente do transcorrido em outros países, foi bastante gradual e sem rupturas evidentes, uma vez que a elite brasileira da época e a Monarquia, historicamente, eram apoiadores e parte do sistema escravista. 

Movimento abolicionista e resistência no contexto da escravidão 

Além do foco na exploração das fontes originais (como o texto da lei ou um trecho de jornal da época, ambos disponíveis na Internet ou em livros especializados), é importante destacar as diferentes formas de resistência e pressão do movimento abolicionista. 

De 1501 a 1900, como mostra o Banco de Dados do Comércio Transatlântico de Escravos (The Transatlantic Slave Trade Database, em inglês), 4,86 milhões de escravos foram desembarcados no território brasileiro – mais do que em qualquer outro lugar. 

Além disso, aconteceram inúmeras revoltas, insurreições, organização de quilombos em todo o território nacional e também outros tipos de resistências mais subjetivas, como a solidariedade e a rede de apoio formada, ainda que de forma velada, nas comunidades negras no Brasil ao longo do tempo. 

“É importante destacar o movimento abolicionista, pois os alunos precisam entender que negros  lutaram contra a escravidão, seja ajudando escravizados que fujiam, seja doando dinheiro para a causa, ou escondendo negros que escapavam de seus senhores.”, pontua o professor.  

Jair menciona, por exemplo, a compositora Chiquinha Gonzaga, que realizava apresentações com a renda revertida para a causa abolicionista. Conhecer a ação de abolicionistas como José do Patrocínio e Luiz Gama ajuda a mostrar aos alunos que o abolicionismo foi um movimento social amplo. “Outro papel importante foi o do Exército. O abolicionismo ganhou força depois da Guerra do Paraguai, quando negros e brancos lutaram lado a lado”, conta Jair, adicionando que o episódio também contribuiu para o abolicionismo dentro do Exército na época, ampliando a pressão para a abolição da escravidão no Brasil.  

Do ponto de vista legal, os marcos que antecederam a Lei Áurea também são fundamentais para a compreensão do processo abolicionista no Brasil. No entanto, é importante que as aulas as contextualizem adequadamente, com fontes e referências de boa qualidade, como livros ou sites especializados para que os alunos possam captar que cada uma é fruto de um contexto específico. 

PONTO DE ATENÇÃO: Na dúvida, é importante sempre buscar uma segunda leitura, fonte ou opinião, em especial se você é um professor que se identifica como branco. É sempre interessante ampliar o olhar para a diversidade, o antirracismo e também se basear no que orienta a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) e a Lei 10.639/2003, que orienta o ensino de História e Cultura Africana. 

Marcos legais: a timeline das leis envolvidas com a abolição da escravidão 

1831 

A primeira delas foi a Lei de 1831, que proibiu o tráfico de africanos para o Brasil. Fruto da pressão da Inglaterra, a lei não foi cumprida e ficou conhecida como a “lei para inglês ver”. Duas décadas depois o movimento abolicionista ganhou força e com isso surgiram leis que visavam acabar com a escravidão, mas de maneira gradual.  

1850

A Lei Eusébio de Queiroz proibiu o tráfico de africanos para o Brasil. “Se manteve a escravidão de quem já era escravizado e de quem nascia da mãe escravizada”, afirma Jair. Mais duas décadas se passaram e em 1871 é assinada a Lei do Ventre Livre, que concedia liberdade para as crianças nascidas de mães escravizadas após os 8 anos de idade. No entanto, lembra o professor, era comum que os senhores exigissem pagamentos ou indenizações da própria criança. Na prática, os pequenos se mantinham escravizadas por mais alguns anos até que a “dívida” fosse quitada com o trabalho. 

1885 

A terceira e última lei que antecede a Áurea foi a dos Sexagenários, em 1885, que libertava escravizados que completassem 60 anos. No último quarto do século 19, a expectativa de vida dos escravizados ao nascer, de acordo com a análise de Stuart B. Schwartz, estava em torno dos 19 anos. A média nacional também era baixa em comparação com a atual, 27 anos ante os atuais 75 anos (IBGE - 2018).  “Nos Estados Unidos, a expectativa de vida dos escravos, por volta de 1850, era de 35 anos e meio, apenas 12% menor do que a da população total e muito superior à de um brasileiro médio. As condições de vida, no século XIX, eram ruins para todos e muito piores para os escravos”, afirma o artigo Expectativa de Vida e Mortalidade de Escravos: uma análise da Freguesia do Divino Espírito Santo do Lamim - MG (1859-1888). 


Para saber ainda mais:

Entendendo a Abolição da Escravatura no Brasil

Plano de aula - Formas de resistência à escravidão

Plano de aula - Uma Lei Áurea? Os significados da Abolição da escravidão

5 conteúdos para refletir sobre a escravidão com a turma

5 planos de aula sobre Escravidão nas Américas



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