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Mudanças climáticas: como incluir o futuro do planeta nas aulas do Fundamental

Complexa e multidisciplinar, a questão das alterações no clima causadas pela ação humana é essencial para os alunos. Aprofunde-se no assunto e saiba como abordá-lo em diferentes componentes curriculares

Ilustração abstrata de chaminés de indústrias soltando fumaça ao fundo com menina regando plantas na parte da frente.
Ilustração: Rafaela Pascotto/NOVA ESCOLA

É mais visível e palpável do que nunca: o clima na Terra está mudando e rapidamente. As notícias sobre a crise climática global estão por toda parte, bem como imagens de fenômenos extremos e discussões sobre o que isso significa para o futuro das próximas gerações.

Ao apoiar a construção de conhecimentos sobre o tema, bem como o cultivo do pensamento crítico, científico e ético dos alunos, as escolas e os professores de diferentes componentes curriculares podem colaborar com a formação para a cidadania e a sustentabilidade dos estudantes e também fazer sua parte na corresponsabilização pelo futuro do planeta e do meio ambiente.

“A escola não pode promover apenas as aprendizagens enciclopédicas, mas precisa ser um espaço em que os estudantes possam entender o mundo onde vivem e as relações que se estabelecem entre as diferentes situações e processos”, explica Pedro Roberto Jacobi, professor titular sênior do Instituto de Energia e Ambiente da Universidade de São Paulo (USP) e editor da revista Ambiente e Sociedade

A emergência climática já está na cabeça dos jovens: 60% sentem-se muito ou extremamente preocupados com o tópico e 45% expressaram que sentimentos como tristeza e ansiedade a respeito do clima afetam o dia a dia, de acordo com uma pesquisa recente, que ouviu pessoas entre 16 e 25 anos em dez países. Entre os brasileiros, 92% dos jovens dizem acreditar que a humanidade falhou em cuidar do planeta e 86% acham que o futuro é assustador.

O fenômeno já tem até um nome, ecoansiedade ou ansiedade climática, e faz cada vez mais parte da realidade de especialistas em saúde mental e educadores que lidam diretamente com crianças e adolescentes.

Parte disso deve-se ao fato de que muitas vezes as crianças e adolescentes são responsabilizados por um futuro que é fruto de decisões das quais nunca fizeram parte, sem muito poder de atuação ou espaços para serem ouvidos, mas também, porque as notícias, de fato, preocupam. 

Nesse ponto, é importante estar atento e acolher os sentimentos e percepções dos estudantes sobre as transformações no meio ambiente, evitando o catastrofismo e apontando a importância de construções coletivas para os desafios climáticos.

Saiba mais sobre as mais recentes informações trazidas sobre a emergência climática pelo Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC) e como abordar o tema em diferentes componentes curriculares no Ensino Fundamental 2 nos demais conteúdos desta edição e nos materiais a seguir:


Cop 26 e IPCC: Como traduzir as informações científicas
Como a história registra as mudanças climáticas?
Matemática e Geografia para explicar as mudanças climáticas


Pontos de atenção e orientações para ensinar sobre as mudanças climáticas no Ensino Fundamental 2

1. Os jovens estão preocupados, mas também na linha de frente das mobilizações pelo clima

Ao mesmo tempo que as notícias assustam, uma nova geração de ambientalistas organiza-se para exigir mudanças políticas e sociais diante das transformações climáticas com a ajuda das redes sociais e de protestos - muitos deles, como a ativista Greta Thunberg, são adolescentes em idade escolar. Trata-se de uma oportunidade para as escolas aproveitarem o interesse dos estudantes pelo tema para conduzir aprendizagens interdisciplinares e promover o protagonismo dos estudantes.


A ativista ambiental sueca Greta Thunberg discursa no Senado brasileiro, que discutia os impactos da crise global do clima, em setembro de 2021.

“Os jovens hoje estão à frente das mobilizações pelo clima para dizer que não querem viver em uma sociedade em que a temperatura tornará nossa vida quase insuportável, indicando que precisamos mudar uma série de hábitos e práticas da vida cotidiana e em relação às políticas públicas”, avalia Pedro Jacobi.

2. Nas discussões, equilibre a responsabilidade individual e a responsabilidade coletiva 

Para conduzir o trabalho pedagógico em relação ao tema, Cíntia Diógenes, bióloga e especialista em Ciências do Time de Autores de NOVA ESCOLA, orienta os professores a mostrarem que há uma responsabilidade social individual, enquanto cidadãos mantenedores do planeta, e a de cobrar os governantes. Mas para que isso não seja uma sobrecarga para os estudantes e dispare ou agrave ansiedades climáticas, é fundamental mostrar que isso também é um dever coletivo, das empresas e dos poderes públicos. “É um caminho para que eles não se percam na desinformação nem no terrorismo das informações”, afirma.

3. Estude como as mudanças climáticas são abordadas na BNCC e outros documentos curriculares

O trabalho em relação às mudanças climáticas encontra respaldo nos Parâmetros Curriculares Nacionais, que trazem a importância de construir novos padrões e modelos de desenvolvimento e melhora na qualidade de vida das populações, focando na educação ambiental, na conservação ambiental, na redução das emissões por desmatamento e na manutenção da integridade funcional dos diversos ecossistemas.

Já na Base Nacional Comum Curricular (BNCC), o tema mobiliza diversas competências no Ensino Fundamental, como a de valorizar e utilizar conhecimentos historicamente construídos, desenvolver o pensamento científico, crítico e criativo, e de agir com responsabilidade e cidadania. Na BNCC, as habilidades estão mais presentes a partir do 7º ano (veja abaixo):

BNCC - Habilidades relacionadas ao tema mudanças climáticas 

Ciências - 7º ano 

EF07CI05 - Discutir o uso de diferentes tipos de combustível e máquinas térmicas ao longo do tempo, para avaliar avanços, questões econômicas e problemas socioambientais causados pela produção e uso desses materiais e máquinas.

EF07CI12 - Demonstrar que o ar é uma mistura de gases, identificando sua composição, e discutir fenômenos naturais ou antrópicos que podem alterar essa composição.

EF07CI13 - Descrever o mecanismo natural do efeito estufa, seu papel fundamental para o desenvolvimento da vida na Terra, discutir as ações humanas responsáveis pelo seu aumento artificial (queima dos combustíveis fósseis, desmatamento, queimadas etc.) e selecionar e implementar propostas para reversão ou controle desse quadro.

EF07CI08 - Avaliar como os impactos provocados por catástrofes naturais ou mudanças nos componentes físicos, biológicos ou sociais de um ecossistema afetam suas populações, podendo ameaçar ou provocar a extinção de espécies, alteração de hábitos, migração etc.

Ciências - 8º ano 

EF08CI01 - Identificar e classificar diferentes fontes (renováveis e não renováveis) e tipos de energia utilizados em residências, comunidades ou cidades.

EF08CI05 - Propor ações coletivas para otimizar o uso de energia elétrica em sua escola e/ou comunidade, com base na seleção de equipamentos segundo critérios de sustentabilidade (consumo de energia e eficiência energética) e hábitos de consumo responsável.

EF08CI14 - Relacionar climas regionais aos padrões de circulação atmosférica e oceânica e ao aquecimento desigual causado pela forma e pelos movimentos da Terra.

EF08CI16 - Discutir iniciativas que contribuam para restabelecer o equilíbrio ambiental a partir da identificação de alterações climáticas regionais e globais provocadas pela intervenção humana.

Ciências 9º ano 

EF09CI13 - Propor iniciativas individuais e coletivas para a solução de problemas ambientais da cidade ou da comunidade, com base na análise de ações de consumo consciente e de sustentabilidade bem-sucedidas.

4. Da Arte à Matemática, é possível abordar as transformações climáticas em diferentes componentes curriculares

Os especialistas recomendam recorrer à Geografia para entender os mapas, os fenômenos e os pactos geopolíticos; à Matemática para entender os gráficos do aumento da temperatura global; em História podem entender o que a Revolução Industrial tem a ver com tudo isso; as Ciências da Natureza trazem explicações sobre os impactos para a biodiversidade e sobre conceitos fundamentais em jogo; em Língua Portuguesa podem trabalhar a produção de cartas, cartazes, petições, redações, análise de reportagens e fake news; e para a Língua Inglesa há a possibilidade de trabalhar com o Atlas Interativo lançado pelo IPCC (veja no quadro resumo abaixo.)

Inspirações e temas-chave para as aulas
Geografia: Mapas, fenômenos climáticos e pactos/disputas/relações geopolíticas
Matemática: Análise e produção de gráficos de aumento de temperatura
História: O papel da Revolução Industrial e da queima de combustíveis fósseis para a elevação das temperaturas
Ciências: Impactos na biodiversidade e conceitos fundamentais
Língua Portuguesa: Produção de cartas, cartazes, petições, redações, análise de reportagens, fake news e letramento midiático
Arte: Intervenções artísticas, fruição de artistas/obras contemporâneas engajadas com o tema das mudanças no clima
Educação Financeira: Formas de consumo e consumo consciente

Há espaço também para discutir consumo, educação financeira e, quem sabe, convidar a Arte e seus processos para que os estudantes possam mobilizar todas as aprendizagens em uma intervenção artística ou um produto final que represente seus pensamentos e sentimentos.

5. Aproveite a oportunidade do trabalho multidisciplinar 

A questão das mudanças climáticas, por ser complexa e multidisciplinar, pede também um trabalho conjunto entre todas as áreas do conhecimento. 

No desenrolar das atividades, vale priorizar trabalhos em grupo, para estimular o debate, argumentação e o trabalho colaborativo, e as metodologias ativas, que destacam o protagonismo dos estudantes.

“No trabalho com eles também é importante destacar sempre que somos uma sociedade em que as pessoas vivem em condições muito diferentes e, portanto, as mudanças climáticas nos afetam desigualmente de acordo com a vulnerabilidade social e as condições das próprias políticas públicas”, lembra Pedro.

Lista de Referências sobre a crise climática

Confira dez livros, documentários, vídeos didáticos e textos para preparar as atividades pedagógicas e engajar os estudantes na discussão das mudanças climáticas.


Nossa Casa Está em Chamas: Ninguém é pequeno demais para fazer a diferença, de Greta Thunberg. Editora Bestseller, 2019. 

O livro de Greta mistura histórias do cotidiano familiar com ativismo ambiental e discursos poderosos que a jovem sueca fez ao redor do mundo. Para os estudantes, uma oportunidade de conhecer a trajetória de uma ativista em idade próxima à deles.


Cowspiracy – O segredo da sustentabilidade (2014)

O documentário, disponível na Netflix, explica a relação entre a agropecuária e o aquecimento global, e é uma forma de detalhar como essa ação humana impacta o meio ambiente.


Em Busca dos Corais (2017)

Também disponível na Netflix, esse documentário mostra outro ecossistema impactado pelas mudanças climáticas e as ações humanas, relatando como ocorre o processo de branqueamento e extinção dos corais ao redor do mundo.


David Attenborough e o Nosso Planeta (2020)

Essa produção audiovisual convida o naturalista britânico a testemunhar as muitas transformações ocorridas no planeta e alerta para diversas mudanças que já são irreversíveis. Disponível na Netflix, pode servir como um panorama das principais mudanças ambientais em âmbito planetário para a turma.


O Subversivo (2020)

Em tom um pouco mais esperançoso, esse documentário disponível no Prime Video traz o momento de crise climática também como uma oportunidade para nós, enquanto indivíduos e sociedade, encontramos uma vida que ofereça resiliência e alegria por meio da ação coletiva.


Causas do aquecimento global e como combatê-lo.

Este vídeo curto do canal Toda Matéria pode ser uma forma simples e didática de introduzir o tema para a garotada. 


10 formas de poluir menos o planeta Terra.

O Manual do Mundo apresenta alguns caminhos para diminuir o impacto das ações humanas; e no bairro e na escola da turma, o que pode ser feito? 


1177 a.C.: O Ano em que a Civilização Colapsou, de Eric Cline.

O livro do professor de História Antiga e Arqueologia na Universidade de George Washington, nos Estados Unidos, ainda não tem tradução para a língua portuguesa, mas é possível conhecer um pouco mais de seus estudos de paleoclimatologia e da Era do Bronze por meio desta conversa.


Saúde Mental e o nosso clima em mudança: impactos, implicações e orientações.

A cartilha, em inglês, apresenta de que forma a saúde mental das pessoas é impactada pelo medo que as mudanças climáticas despertam. Também oferecem dicas de como lidar com essas angústias.


Máquina do tempo do clima.

A Nasa, agência espacial estadunidense, preparou um conteúdo interativo que mostra as mudanças ao longo dos anos nas massas de gelo, nível do mar, concentração de dióxido de carbono e temperatura global. É ideal para mostrar concretamente essas transformações ao redor do mundo e as regiões mais impactadas.


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