Conexão Família-Escola

Choro, família e Matemática: volta às aulas emociona e motiva casal de professores

Professores na EE Prof. Maria Luiza Bernardes Nory, em Penápolis (SP), Fernanda Saeme e Thiago Viana levaram a escola para casa durante a pandemia

Ilustração abstrata de professores de matemática e famílias interagindo ao redor da palavra conexão.
Ilustração: Thiago Lopes (Estúdio Kiwi)/NOVA ESCOLA

Que a pandemia levou a escola para dentro da casa de alunos e professores já é sabido. Na casa dos professores Thiago Viana e Fernanda Saeme, o desafio foi multiplicado: ambos lecionam Matemática na mesma escola e, ao longo do último ano e meio, trabalharam mais próximos do que nunca. 

Desde março de 2020, os cálculos e hipóteses matemáticas do 6º e 7º anos da EE Professora Maria Luiza Bernardes Nory, em Penápolis (SP) fazem parte da nova rotina dos educadores, que dividem o momento da reabertura e as dores e delícias do ensino híbrido em casal com o filho Dudu. 

Aos 4 anos, o pequeno estuda em casa desde que a rede entrou em ensino remoto. Thiago, que ocupava o escritório, acabou de retornar para a escola. Fernanda, grávida, segue lecionando on-line da sala de jantar para as turmas.

Ambos egressos da escola pública, os educadores conversaram com o Nova Escola Box e compartilharam as experiências vividas ao longo da pandemia e agora no retorno presencial à escola.


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A troca, já uma constante desde que o casal se conheceu, em 2014, tornou-se ainda mais próxima. “A nossa casa virou uma escola. Dependendo do tom de um ou de outro, até brincava com meus alunos: olha lá o professor Thiago, tá empolgado”, lembra Fernanda. 

“Um acaba ouvindo o que o outro está falando. Eu sou mais manual, vamos fazer. O Thiago já é mais tecnológico, essa troca foi legal”, conta a professora, que sente falta do contato com os alunos.

“A saudade é enorme, o contato é importantíssimo. Às vezes eu surpreendo e apareço fora do meu horário de trabalho. Eles têm curiosidade de me ver, de ver o tamanho da barriga, é o jeito que eu tenho de matar a saudade.”

Fernanda assumiu as aulas na atual escola neste ano, então só conhece pessoalmente seus alunos por esses acenos esporádicos.

A saudade segue sendo driblada pela tecnologia. “Eles sabem que a professora Fernanda está ali, não é distante. Eles colocam o caderninho para poder focar e eu olhar de perto”, conta ela, que planeja retornar após a licença-maternidade.

Apoio das famílias 

As aulas remotas não foram fáceis para ninguém. Mas o estranhamento inicial deu espaço para o apoio das famílias no processo, conta Fernanda, que vê como crítico o incentivo para a aprendizagem do componente currícular no 6° ano. 

"Falava: quero que vocês tenham um lugar para o caderno. E quando eu ligava eles me mostravam: professora, minha mãe colocou aqui para eu estudar", lembra a professora de Matemática.

"Teve mãe que adaptou um móvel, uma mesinha, e eles ficavam nessa ansiedade para mostrar, arrumavam o cabelinho, as meninas de batom, uma graça”, relata. 

“Por mais difícil que seja, eu não consigo olhar e desistir. Se a criança não sabe fazer um cálculo, vamos contar no dedo. Vamos dar um jeito”, afirma Fernanda.  

A pandemia criou também uma nova relação entre professores e famílias dos alunos.

A escola onde Thiago e Fernanda trabalham é numa região periférica do município de Penápolis e a vulnerabilidade acentuou-se com a pandemia. 

Num primeiro momento, houve a necessidade de convencer as famílias da importância de manter os alunos engajados no ensino remoto.

Hoje, os laços seguem estreitos. Mesmo de volta à escola, os pais habituaram-se a falar com os professores pelo WhatsApp para saber de tarefas e provas. E as histórias de envolvimentos são muitas.

Fernanda se lembra com carinho da avó de um de seus alunos com deficiência, que apareceu na chamada de vídeo acompanhando as aulas do neto.

“Ela me deu parabéns pela aula e ele contou que tinha explicado uma parte para a avó. Ela disse que estava adorando porque também estava aprendendo matemática”, emociona-se Fernanda.

Choro e emoção no retorno 

O professor Thiago, por sua vez, já voltou para a escola, mas é coisa recente. Diabético, só retornou ao presencial em meados de setembro, após tomar a segunda dose da vacina.

“Eu chorei”, conta. Professor também da rede particular (no Colégio Franciscano Coração de Maria), foi o penúltimo a retornar.

“Estava tudo enfeitado, eles queriam falar das saudades que eles estavam, que queriam ver a gente próximo, e aí a gente não aguenta”, recorda.

Depois de duas semanas de volta à sala de aula, Thiago é categórico ao afirmar que os alunos têm potencial.

“É essa a proposta: agora está ruim. No ano que vem, a gente começa a colocar a casa em ordem para que eles possam chegar lá na frente, oitavo, nono ano, com algumas características da matemática que vão ser importantes para o Ensino Médio. Esta é a intenção de trabalharmos juntos”, afirma, ao reforçar a parceria com Fernanda.

Trocas didáticas e apoio dentro de casa 

As trocas não pararam nas experiências didáticas com os alunos. Thiago, que atua também na formação de professores, pode observar como nunca a atuação da esposa e colega.

“Quando você está dentro do processo, não consegue ver outras saídas. A nossa sala é dividida por parede, enquanto ela dava aula eu ouvia e pensava: 'Isso aí não foi bom, não'. E o mesmo processo acontecia ao contrário”, afirma Thiago.

O que agora está azeitado, no início foi um choque. Para atravessar tantas mudanças somadas à sobrecarga de trabalho, foi fundamental abraçar a mudança e pedir empatia.

Alunos e colegas tinham de entender que ali era o lar do casal e que o Dudu faz parte da rotina. E os alunos, em suas casas, com suas rotinas também transformadas, entenderam. 

“Fomos criando essa amizade e esse respeito um pelo outro. As crianças sabem que tem o Dudu. Ele acorda, vem todo descabelado e fala bom dia, alunos, bem natural”, ri a professora.

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