Para que falar de permafrost em um país tropical?
Com a abordagem certa, é possível aproximar o tema da realidade dos alunos brasileiros e, a partir dele, explorar outros assuntos
Assim que iniciou a aula sobre permafrost com os alunos do 8º ano da EE Vila do Lago, em Tarumã (SP), o professor de Ciências Lucas Spider Leny questionou se eles conheciam o termo. A referência da turma veio dos cinemas: “Eles lembraram de personagem do filme A Origem dos Guardiões, o Jack Frost”, diz. Na animação, Jack controla o vento, o frio e a neve. E foi daí que o educador começou sua aula. “Partir dessa referência trazida por eles foi importante para deixá-los mais envolvidos com o assunto”, afirma.
Um dos desafios do professor de Ciências é tornar palpável aos alunos brasileiros um assunto que se passa em terras tão distantes, com cenário tão fora do alcance como aquele formado pelas superfícies congeladas dos polos do planeta.
Veja, por exemplo, o que aconteceu com a professora Natallie Reikdal Cervieri, da EMEF João Pedro da Silva, em Cariacica (ES). Após explicação sobre os aumentos sucessivos de temperatura registrados globalmente, a docente ouviu de um aluno: “Mas como a temperatura tem aumentado se fez frio ontem?” “Quando isso aconteceu, retomei a explicação sobre como os poluentes jogados na atmosfera estão mexendo com o efeito estufa, e que essas mudanças acontecem em escala mundial, alterando a média das temperaturas - o que independe do tempo local”, conta a professora. Pensando com mais calma depois da aula, ela concluiu que poderia ter feito algo diferente: “Teria sido muito válido mostrar um gráfico do aumento da temperatura média nos últimos anos e pedir que alunos o comparassem com outro, que mostra as variações de temperatura no planeta nas últimas centenas de anos”.
Em sala de aula, o professor Lucas questionou os alunos sobre ações para diminuir o aumento crescente das temperaturas mundiais. Depois de ouvir as sugestões dadas pelos alunos sobre o que governos deveriam fazer, o professor questionou como eles poderiam atuar nas próprias comunidades. “Aí é que eles perceberam que podem fazer a diferença. Eles já estão sentindo os impactos negativos das mudanças climáticas. Não é coisa de futuro distante, que os seus netos sentiriam. Está acontecendo agora”, enfatiza. Na aula, listaram medidas como a redução no uso do carro e a separação do lixo reciclável, entre outras.
Mas nada de alarmismo! O tom da aula precisa ser moderado: “É preciso tratar das questões ambientais com o foco da conscientização. Falar dos riscos, sim, mas com o enfoque sobre como podemos mudar o cenário desfavorável”, explica Natalie.
Explorar os dados atuais também ajuda a materializar o problema. Em fevereiro, por exemplo, a Antártida registrou temperatura recorde, com máxima histórica de 20,75 graus Celsius, na Ilha Seymour, a mesma temperatura que a capital paulista registrava no mesmo dia da medição.
Vale lembrar, ainda, outra razão que justifica a presença do tema: ele se relaciona a uma das habilidades previstas na Base Nacional Comum Curricular (BNCC) do 8º ano. Diz o documento:
(EF08CI16) Discutir iniciativas que contribuam para restabelecer o equilíbrio ambiental a partir da identificação de alterações climáticas regionais e globais provocadas pela intervenção humana. (BNCC, p. 387)
O descongelamento do permafrost é um exemplo dos efeitos que as mudanças climáticas causam no planeta. Por isso é útil para desenvolver essa habilidade, que integra a unidade temática Terra e Universo. O debate pode inserir-se em uma sequência mais ampla de estudos sobre a importância da preservação dos oceanos ou da própria questão das mudanças climáticas.
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