Para repensar a rotina

Por que a rotina é importante para as crianças?

Saber quais serão as tarefas do dia, aprender a se situar no tempo, manter o reloginho biológico: ter rotina ajuda em tudo isso e diminui a ansiedade durante o isolamento

Criar uma rotina de atividades e estabelecer horários é uma forma dos pequenos se organizarem e autorregularem. Ilustração: Nathalia Takeyama/NOVA ESCOLA

As crianças também percebem que algo diferente está acontecendo. Em virtude da pandemia da Covid-19, elas não estão indo à creche e não tem contato com familiares fora de sua residência, o que muda muito seu dia a dia. Clarissa Pereira, coordenadora pedagógica do Colégio Apoio, de Recife (PE), tem aconselhado as famílias dos pequenos a conversarem com  eles sobre isso, mas cuidando do tom: “É preferível usar o termo protegido e não preso em casa”, diz. “O primeiro passo é esclarecer o que está acontecendo sem minimizar a doença, mas também sem aumentar o medo. Explique [às crianças] que estão seguras em casa e que é preciso construir uma nova rotina para esse novo contexto”. 

Uma rotina traz segurança em um momento de tamanha indefinição como o de uma pandemia mundial.  Definir atividades (acordar, tomar café, brincar, assistir desenho, almoçar, fazer uma atividade escolar, conversar com os avós por videochamada) ajuda a criança a se organizar e se autorregular. “Essa previsibilidade é organizadora de todo o psiquismo da criança, e independe de estarmos ou não na quarentena. A rotina as ajuda a entender como o mundo funciona e a se organizarem emocionalmente para os desafios do dia a dia”, comenta Roberta Tavares Lopez, psicóloga clínica e educacional e terapeuta de crianças, adolescentes e famílias. 

Não saber quais atividades estão previstas pode deixar as crianças mais ansiosas, irritadas e causar a necessidade de perguntar constantemente aos pais o que pode ser feito. Para que elas se adaptem melhor, a família precisa levar em conta a rotina no período anterior ao da quarentena: horário em que acordavam, tempo de sono, quantidade de horas assistindo televisão etc. “Lembre-se que quando a quarentena acabar, o reloginho biológico da criança e seus hábitos precisarão ser regularizados novamente”, diz Clarissa. Portanto, o intuito não é reproduzir os horários e rotina escolares, mas estabelecer bases e limites saudáveis para cada momento. 

As noções de tempo durante o isolamento
Ao ficar muito tempo em um mesmo espaço, é normal que percamos a noção da passagem do tempo. Para as crianças, que ainda estão construindo a percepção de sequência temporal, a dificuldade em distinguir dias, semanas, meses e estações do ano será ainda maior. Recursos visuais ajudam a explicar como o tempo é organizado. Por isso, os pais podem conversar sobre como o tempo é organizado (eles podem contar com os filhos há quantos dias e semanas estão em casa) e fixar um calendário e o mural com a rotina da família em um local de fácil visualização (nesta caixa, você encontra um modelo para enviar às famílias).

Para os adultos, a situação também é nova e inusitada. Muitos estão trabalhando e, mesmo em casa, não estão disponíveis o tempo todo. Eles também precisam estabelecer uma rotina e compartilhá-la com as crianças. E mais: cumprir o que foi proposto é importante para que elas compreendam a importância dos combinados. A psicóloga Roberta Tavares defende que como o momento social é de mudanças, frustrações e perdas, os pais também precisam entender que nem tudo ocorrerá exatamente conforme o combinado e devem se explicar e se desculpar com as crianças quando necessário, além de não se cobrarem muito.

Momentos especiais (ir ao parque, ao cinema, jantar em uma pizzaria) fazem parte da vida e podem ser adaptados para a nova realidade: uma tarde de culinária com receitas da família, um piquenique no quintal ou na sala, a confecção de uma pipa ou a exposição de desenhos e outras obras de arte feitas pela família, por exemplo. “É importante proporcionar momentos para que criem-se memórias afetivas sobre essa quarentena. São elas que formam valores, vínculos e ensinam a lidar com emoções”, explica Roberta. “Daqui a 10 anos, nenhuma criança vai se lembrar do que deveria estar vivendo na escola, mas pode se lembrar desses momentos especiais em casa”.

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