Para repensar a prática

A Matemática das aulas de Arte (e vice-versa)

O trabalho das professoras Maria Theresa e Aparecida mostra o poder da parceria e a importância da Matemática no cotidiano

Parceria entre as professoras Maria Theresa (à esq.) e Aparecida, da EE Alfredo Paulino, em São Paulo. Foto: Felipe Portella

Quem é de humanas é ruim em exatas e detesta Matemática, certo? Se a sua resposta foi sim, é porque ainda não conhece essas duas mulheres da foto. 

Maria Theresa Bologna é professora de Arte na EE Alfredo Paulino, em São Paulo. Ela chegou a escola em 2015 e, junto com a equipe pedagógica, identificou que os alunos apresentavam dificuldade com Geometria, especialmente nas provas externas. “Sou apaixonada por desenho e por essa área da Matemática, então pensei que podia ajudar”, conta a docente. 

Então, Maria Theresa correu atrás de formação. Fez cursos para se aprofundar no assunto e incorporou às suas aulas o trabalho com grandezas e medidas. Entre as atividades que ela desenvolve com os alunos está a manipulação de réguas, habilidade necessária para a sua disciplina na hora de fazer estudos sobre profundidade e perspectiva nos desenhos, por exemplo.

Mas a professora não fez isso sozinha. A inserção da Matemática nas aulas de Arte foi planejada junto com as professoras polivalentes. Uma das parceiras de Maria Theresa foi a professora Aparecida Alcântara Bastos, do 5º ano. Para organizar esse trabalho, elas rotineiramente verificam o que vão trabalhar e fazem a divisão de quem ficará mais responsável por qual parte do conteúdo. A troca é contínua e uma acompanha a aula da outra. De forma geral, Maria Theresa fica com as atividades práticas, mas já introduz conceitos importantes que são aprofundado por Aparecida. “Eu ensino o conteúdo de uma forma aplicada. Observamos e medimos tudo o que tem ao nosso redor”, conta Maria Theresa. A partir das dúvidas que surgem na aula de Arte, a professora polivalente se aprofunda na teoria e propõe a resolução de situações-problema. 

Aparecida só vê vantagens na parceria: "Os alunos lembram dos conceitos com mais facilidade quando têm uma experiência prática", afirma. Quando surge uma dúvida na classe ou a turma quer pensar em estratégias para fazer um cálculo, ela retoma a experiência que tiveram com a Maria Theresa.

Em sintonia com a Base

Esse trabalho repleto de contextualização, significado e experiência é muito interessante para o processo de aprendizagem e tem tudo a ver com a proposta da Base Nacional Cumum Curricular (BNCC) de Matemática trouxe para a área de grandezas e medidas. O documento tira o foco da transformação de unidades e se concentrar no significado das grandezas. "Para que a criança compreenda o que é comprimento, área ou massa, ela precisa conhecer os contextos onde essas grandezas naturalmente aparecem", afirma Maria Ignez Diniz, diretora do Mathema. A especialista explica que a transformação não deve deixar de ser trabalhada, mas que não é a essência ou a finalidade desse estudo. "O que precisa ficar em evidência é a construção do significado da grandeza. O número medido é consequência e é útil para construir o conceito, mas ele não pode ser o centro da atividade" defende a especialista. Nessa perspectiva, estratégias como a famosa 'escadinha', na qual se converte unidades de medida mudando a vírgula de lugar, perdem espaço. 

Alexandre Silva, professor do curso de Licenciatura em Matemática do Instituto Singularidades e integrante do Grupo Colaborativo de Investigação em Educação Matemática, da USP, aponta que o professor proponha atividades que evidenciem a necessidade de medir. Como exemplo, ele dá a ideia de levar jarras com diferentes tamanhos e formatos e perguntar qual é a maior. A tendência é que os alunos respondam que é a mais alta, e, a partir daí, o educador pode questionar essa resposta e perguntar como eles poderiam fazer a verificação.

Há outras possibilidades, como trouxemos neste conteúdo, mas, segundo Alexandre, há três pontos que não podem faltar nessas atividades de medição: que os alunos escolham a unidade de medida adequada; que comparem as medidas - sempre dentro da mesma grandezas; e que obtenham um número, mesmo quando trabalham com unidades de medida não-padronizadas.



Grandezas e medidas são a mesma coisa? 

Não, mas a confusão é comum. Para explicar a diferença, Maria Ignez Diniz, diretora do Mathema, propõe um exercício de imaginação: "Pense na distância do seu trabalho até sua casa. Essa distância existe independente de sua medida. A distância é uma grandeza. Agora, quando dizemos que a distância de seu trabalho até sua casa é de cinco quilômetros, significa que medimos a grandeza 'distância', associando a ela um número e uma unidade". Ou seja: grandeza é tudo que pode ser medido (área, volume, massa, tempo etc), e a medida é o número relacionado a uma grandeza. Esse número está associado a uma unidade padrão (metro, centímetro, grama etc).

A especialista ressalta que a confusão entre esses dois conceitos é esperada entre os alunos dos anos iniciais. 



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