Para aprender sobre a prática

Corpo, gestos e movimentos: o campo para experimentar sensações

O aspecto físico do bebê e da criança não pode ficar de fora do processo educacional - e a BNCC reconhece essa necessidade

Glaucia Stopa, de São Caetano do Sul, conduz uma atividade relacionada ao campo de experiência "Corpo, gestos e movimentos". Foto: Andris Bovo/NOVA ESCOLA

Na Educação Infantil, o corpo ganha centralidade por meio da dança, da música, do teatro e das brincadeiras. O campo Corpo, gestos e movimentos, o segundo entre os cinco descritos na Base Nacional Comum Curricular (BNCC), coloca o foco na busca por descobertas sensoriais dos pequenos, com ênfase na interação da criança com o meio e com os outros. “Com gestos e movimentos, eles experimentam suas potencialidades e limites”, explica Aline Castro, autora e coordenadora pedagógica. 

Nesse campo, as atividades de caráter cultural podem render grandes experiências para educadores e alunos. “Tem a ver com conhecer e respeitar o próprio corpo e usar as diversas linguagens para se expressar”, destaca Andrea Ramal, consultora e doutora em Educação pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio). Para compreender ainda mais a proposta da Base, vale a pena ler o que o próprio documento diz:

“Na Educação Infantil, o corpo das crianças ganha centralidade, pois ele é o partícipe privilegiado das práticas pedagógicas de cuidado físico, orientadas para a emancipação e a liberdade, e não para a submissão. Assim, a instituição escolar precisa promover oportunidades ricas para que as crianças possam, sempre animadas pelo espírito lúdico e na interação com seus pares, explorar e vivenciar um amplo repertório de movimentos, gestos, olhares, sons e mímicas com o corpo, para descobrir variados modos de ocupação e uso do espaço com o corpo (tais como sentar com apoio, rastejar, engatinhar, escorregar, caminhar apoiando-se em berços, mesas e cordas, saltar, escalar, equilibrar-se, correr, dar cambalhotas, alongar-se etc.).”

BNCC, disponível em http://basenacionalcomum.mec.gov.br/abase/#infantil/os-campos-de-experiencias. Acesso em: 3 de setembro de 2020.

Testando possibilidades

Um exemplo concreto de como traduzir a teoria para a prática é sugerido por Glaucia Stopa, educadora na EMI Candinha Massei Fedato, em São Caetano do Sul (SP), que explorou a curiosidade natural dos bebês e crianças bem pequenas (zero a 1 ano e 6 meses e 1 ano e 7 meses a 3 anos e 11 meses, respectivamente, segundo o critério da BNCC) em manusear objetos, produzindo e pesquisando sons. “Cada grupo tinha seu próprio som e ritmo, por vezes observando o colega e imitando suas ações. Os pequenos percebiam que era possível produzir diferentes sons com o mesmo objeto, batucando em diferentes superfícies, como na madeira ou no alumínio. Também percebiam a intensidade e a altura dos sons produzidos, despertando mais ainda a pesquisa e envolvimento do grupo”, diz.

Prática semelhante fez Jefferson Felix, da EMEB Fernando Pessoa, em São Bernardo do Campo (SP). O objetivo era incentivar a interação e a exploração ampla de movimentos, por meio de um material que desperta a atenção da turma.

A proposta aconteceu dentro da sala de referência, cujo espaço foi organizado com varais de barbante e pedaços de papel higiênico presos a eles. As mesas, cadeiras e o chão também foram cobertos por papel higiênico. O professor deve pensar nas especificidades do seu grupo de crianças, considerar a quantidade do material, pensar em um espaço que propicie interações e exploração ampla de movimentos. Deve ainda organizar o material de forma investigativa. Jefferson pendurou os pedaços de papel em barbantes para que as crianças pudessem puxar. “Colocamos muito papel pelo chão, mesas, cadeiras e não limitamos a exploração e significação das crianças durante a brincadeira”, explica. Antes de iniciar a atividade, o educador colocou as crianças em roda e convidou cada uma a expressar o que sentiu ao ver o espaço organizado daquela forma, o que sabia sobre o material utilizado e como gostaria de brincar com aqueles objetos. Após a conversa, as crianças iniciaram a brincadeira com o material.

A turma divertiu-se usando os materiais para brincar e fazer representações simbólicas: as crianças rasgaram e jogaram papel para o alto, colocaram sobre o cabelo, dançaram com ele, correram de um lado para o outro com bolas de papel nas mãos. “Algumas imaginaram estar nadando e que um grande monstro estava comendo o papel higiênico”, lembra Jefferson. Ao final da proposta, as crianças relataram as sensações que tiveram com essa experiência. Jefferson conta que as crianças expressaram que a sala parecia muito divertida e interessante e que gostaram de jogar tudo para cima e brincar muito. Algumas contaram que nunca tinham usado o papel higiênico para além de limpar o nariz e se higienizar depois de usar o banheiro.


Conteúdo publicado originalmente em NOVA ESCOLA BOX no dia 15 de outubro de 2019. O texto foi reeditado e sofreu alterações.

Mais sobre esse tema